Chamada de artigos para a edição n. 26
Oh, musa do meu fado
Oh, minha mãe gentil
Te deixo consternado
No primeiro abril
Mas não sê tão ingrata!
Não esquece quem te amou
E em tua densa mata
Se perdeu e se encontrou
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal!
(Chico Buarque e Ruy Guerra – “Fado Tropical”)
Lisboa, não sejas racista
Colonialista
De civismo à Brás
Lisboa, destino traçado
Na escola colado
À mesa de trás
Lisboa, limpa por mulheres
Às quais não conferes
Direito a sonhar
Lisboa, não sejas racista
É tão quinhentista
Vê se mudas de ar
(Fado Bicha – “Lisboa, não sejas racista”)
Eu falo p’ró povo,
p’ós injustiçados,
p’ós esquecidos,
deslocados,
mutilados,
mas também os abastados,
falo para todos que ao ouvir isto vão perguntar-se:
“Quem somos nós afinal?
O que sonhámos?
Pelo quê lutamos?”
(Ikonoklasta – “Afirmação”)
Amparo do Rosário ao negro benedito
Um grito feito pele do tambor
Deu no noticiário, com lágrimas escrito
Um rito, uma luta, um homem de cor
E assim quando a lei foi assinada
Uma lua atordoada assistiu fogos no céu
Áurea feito o ouro da bandeira
Fui rezar na cachoeira contra bondade cruel
[...]
Não sou escravo de nenhum senhor
Meu Paraíso é meu bastião
Meu Tuiuti o quilombo da favela
É sentinela da libertação
(Paraíso do Tuiuti – Samba-enredo 2018)
Em O século da canção (2008), Luiz Tatit afirma que a “mobilidade melódica de palavras, frases e pequenas narrativas ou cenas cotidianas” sempre estiveram ligadas à “prática musical brasileira”. É muito provável que, por esse motivo, parte das investigações preocupadas com as relações entre Literatura e Música, ao se voltarem para a letra da canção, procuram estabelecer pontos de intertextualidade entre a produção musical e literária ou, como se vê em boa parte dessas investigações, análises que emprestam ferramentas dos estudos literários, sobretudo os vinculados à poesia, para efetivar avaliações em um produto cultural outro, que é a canção.
No ensaio “´Ser preto tipo A custa caro´: poesia, interculturalidade e etnia” (2008), Emerson Inácio aponta para a necessidade dos estudos literários se reconhecerem a partir das suas “múltiplas relações interdisciplinares e transdisciplinares”, o que levaria a Literatura – e não apenas as outras artes – a se ver “compreendida levando em conta as diversas inter-relações que continuamente estabelece com outros objetos culturais e sociais e outras linguagens”.
Tendo como ponto de partida essas verificações teóricas, bem como as possíveis reflexões que as epígrafes podem suscitar, o Dossiê 26 da Revista Crioula, intitulado “Relações entre Literatura e música na produção de língua portuguesa”, receberá contribuições inéditas de artigos ou ensaios que apresentem olhares diversos para as inter-relações entre literatura e música produzidas nos contextos brasileiro, português ou africano de língua portuguesa.
Os artigos enviados que apresentarem tema diferente ao proposto para o dossiê poderão compor a seção “Artigos & Ensaios”. Serão aceitos também resenhas, entrevistas e pequenos textos ficcionais em prosa e poemas, desde que estejam de acordo com as normas de publicação da revista.
Autores publicados na edição anterior precisam esperar o intervalo de dois números da publicação da revista para submeterem novos textos.
Recomendamos a leitura atenta das normas de publicação.
Prazo para submissão de textos originais: até 05/11/2020