Sobre farpas e espinhos: dimensões tensivas de discursos xamânicos Hupd'äh e Desana

Autores

  • Danilo Paiva Ramos Universidade Federal da Bahia

DOI:

https://doi.org/10.11606/issn.1980-4016.esse.2019.151313

Palavras-chave:

Discurso, Alto Rio Negro, Xamanismo, Multilinguismo

Resumo

Sentados numa roda para o consumo de coca, benzedores Hupd’äh e Desano conversavam, em língua Tukano, sobre o encantamento do espinho patogênico. Habitantes da região do Alto Rio Negro-AM, os interlocutores buscavam entender como curar um senhor enfermo atingido pela doença causada por espinhos de patauá que sofria com fortes dores nas pernas. Tendo como referência o campo de debates sobre o multilinguísmo e contato linguístico no Alto Rio Negro-AM, o presente trabalho parte da comparação estabelecida pelos próprios enunciadores entre versões em língua Hup e Desana de encantamentos xamânicos. A aproximação entre a etnografia da fala e a semiótica tensiva permite mostrar como padrões formais e temáticos contribuem para diluir a carga tensiva de acontecimentos que evidenciam comunicações e interações sociocosmicas. A análise permite a descrição do gênero verbal “benzimento” como sendo marcado por enquadramentos espaço-temporais que relacionam a mobilidade sociocosmica, a tradução de pontos de vista e a comunicação intercultural e interespecífica com animais, plantas e espíritos. Pretende-se, assim, evidenciar em que medida tomar o discurso xamânico como uma matriz de difusão linguística pode ser fundamental para entender melhor as dinâmicas e processos de contato e mudança linguísticas no Alto Rio Negro. 

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Biografia do Autor

  • Danilo Paiva Ramos, Universidade Federal da Bahia

    Docente do Departamento de Antropologia e Etnologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

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Publicado

2019-04-11

Como Citar

Sobre farpas e espinhos: dimensões tensivas de discursos xamânicos Hupd’äh e Desana. (2019). Estudos Semióticos, 15, 196-213. https://doi.org/10.11606/issn.1980-4016.esse.2019.151313