Errar é urbano. Para uma hodologia de Lisboa

Autores

  • Tiago Mesquita Carvalho Universidade de Lisboa

DOI:

https://doi.org/10.11606/issn.2317-2762.v21i36p102-123

Palavras-chave:

Mobilidade urbana. Automóveis. Espaço público. Lugar. Caminhar. Tecnologia. Urbanismo. Lisboa.

Resumo

O artigo apresenta a genealogia histórica do favorecimento do automóvel na cidade e as mudanças concomitantes no urbanismo, na pedonalidade e na criação e preservação de lugares, salutares para o exercício da cidadania. Pretende-se demonstrar que a adoção generalizada da automobilidade, enquanto tecnologia de impacte múltiplo e pernicioso, afectou uma metodologia geral de configuração do espaço; provocou igualmente uma erosão do caminhar e do sentido de lugar, nos centros históricos de várias cidades europeias, sacrificando as necessidades dos peões e a convivialidade das ruas e do espaço público. Na primeira parte, por razões de acessibilidade aos arquivos da Hemeroteca, escolhemos expor o estudo de caso de Lisboa, ilustrando como o poder político e os urbanistas se aliaram, para modificar a cidade, valorizando o papel das demolições e do automóvel, como cura para males sociais. A nossa análise centrar-se-á na génese do Código da Estrada e nos discursos do órgão oficial do Automóvel Clube de Portugal (ACP) e de revistas da época, os quais documentam as transformações ocorridas no centro histórico da Lisboa de meados do século 20. Na segunda parte, através de uma análise fenomenológica, examinamos como o caminhar e a condução motorizada constituem o mundo de diferentes modos; cada um promove assim um acesso diferenciado às qualidades da cidade, justificando uma perspectiva própria na percepção e ação na forma urbana, adotada pelos habitantes da cidade e por urbanistas. Concluímos tecendo algumas considerações sobre os efeitos da automobilidade na vida urbana, ao se tornar um pressuposto tácito no urbanismo; o espaço público é progressivamente convertido em estacionamento, nós viários, semáforos e passadeiras; os peões, por sua vez, veem os seus gestos, hábitos e comportamentos domesticados e negligenciados; a pedonalidade em Portugal passou assim a ser social, política e tecnicamente invisível, de acordo com os modelos científicos e técnicos da automobilidade. 

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Biografia do Autor

  • Tiago Mesquita Carvalho, Universidade de Lisboa

    Mestre em Filosofia da Natureza e do Ambiente, FLUL. Membro colaborador do Centro de Filosofia da UL desde 2009, como investigador no projeto “Filosofia e Arquitectura da Paisagem”. Membro da Sociedade de Ética Ambiental desde 2013.

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Publicado

2015-02-24

Edição

Seção

Artigos

Como Citar

Carvalho, T. M. (2015). Errar é urbano. Para uma hodologia de Lisboa. PosFAUUSP, 21(36), 102-123. https://doi.org/10.11606/issn.2317-2762.v21i36p102-123