Este artigo apresenta um exame da relação, apontada por Lacan, entre a maturação do objeto a na puberdade e a formação dos conceitos, com ênfase na interlocução entre esse psicanalista e Vygotsky. Na perspectiva vygotskiana, a entrada no pensamento conceitual só se efetua a partir da maturação pubertária, em virtude das novas funções psíquicas adquiridas nessa fase. Essa concepção corrobora a proposição lacaniana de que as transformações decorrentes do encontro com o objeto na puberdade - tempo lógico em que o sujeito tem que se haver com a falta de uma maneira inédita - proporcionam a assimilação dos conceitos. Considerando que se trata de um debate de fundo que não é evidente no contexto em que aparece na obra de Lacan, propõe-se investigar a finalidade dessa interlocução na elaboração lacaniana sobre a puberdade, que constitui uma importante contribuição à abordagem psicanalítica da adolescência.
Cet article présente un examen de la relation, indiquée par
En este trabajo se presenta un análisis de la relación, señalada por Lacan, entre la madurez del objeto en la pubertad y la formación de conceptos, con un énfasis en el diálogo entre este analista y Vygotsky. En la perspectiva de Vygotsky, la entrada en el pensamiento conceptual sólo tiene lugar a partir de la maduración puberal, debido a las nuevas funciones psíquicas adquiridas en esa etapa. Este concepto apoya la proposición lacaniana de que los cambios resultantes del encuentro con el objeto en la pubertad -momento lógico en que el sujeto se ve obligado a encararse com la falta de una manera sin precedentes- proporciona la asimilación de los conceptos. Considerando que esse es un debate no evidente en la obra de Lacan, se propone investigar la función de este diálogo en la elaboración lacaniana sobre la pubertad, que es una contribución importante para el enfoque psicoanalítico de la adolescencia.
Este artigo apresenta um desenvolvimento teórico extraído de uma pesquisa de doutorado em Psicologia
Formulamos a hipótese de que a conexão entre a puberdade e o pensamento conceitual concerne a uma proposição original de Lacan, consistindo numa importante contribuição à abordagem psicanalítica da adolescência. A articulação entre a maturação pubertária, concernente à incidência do real orgânico no corpo, e a assimilação dos conceitos, num tempo lógico pautado pela angústia de castração, diz respeito à associação entre uma capacidade do pensamento e a emergência de um vazio. Trata-se de uma novidade que se apresenta no campo do saber num momento em que o não saber se impõe ao sujeito de maneira radical. Para compreender essa formulação lacaniana sobre a puberdade, é preciso examinar o panorama teórico em que ela se constrói.
Em O seminário, livro 10: a angústia,
Conforme
Nesse sentido,
Pois bem,
Em sua breve incursão no debate pedagógico,
Ao ajudar a criança a abordar esses problemas, apenas ao ajudá-la, quero dizer, faz-se algo que tem não só um efeito prematurador, um efeito de pressa no amadurecimento mental, mas que, em certos períodos chamados sensíveis, . . . permite obter verdadeiros efeitos de abertura ou de desencadeamento. Algumas atividades de apreensão têm, em certos campos, efeitos de fecundidade absolutamente excepcionais. (
Numa alusão a “autores cujo testemunho é ainda mais interessante conservar” (p. 282), visto que não fazem ideia de suas contribuições para a psicanálise, Lacan evoca a questão da puberdade, decerto um dos mencionados “períodos chamados sensíveis” (p. 282):
O fato de um dado pedagogo ter formulado que só há verdadeiro acesso aos conceitos a partir da idade da puberdade mereceria que acrescentássemos nosso olhar, que metêssemos nosso nariz nisso. Há milhares de indícios sensíveis de que o momento em que realmente começa o funcionamento do conceito, e que os autores chamam - no caso, por uma homonímia puramente fortuita com o termo complexo, do qual nos servimos - de momento-limite complexual, poderia ser situado de maneira totalmente diversa, em função de um vínculo a ser estabelecido entre a maturação do objeto a, tal como eu o defino, e a idade da puberdade. (
Em nossa hipótese, o que viabiliza a apreensão dos conceitos é justamente a emergência de um vazio relacionado ao ponto vivo do sujeito (
Logo após essa proposição,
É preciso indagar em que consiste o conceito para
A maturação do objeto a torna patente para o sujeito a hiância inerente à sexualidade. A promoção do significante fálico nesse tempo lógico é acompanhada por intensa angústia em face das exigências do supereu. Por conseguinte, de saída, as expectativas sobre o nível genital são marcadas pela insatisfação, e o objeto a tende a operar em sua vertente mais-de-gozar. Por ser o que atualiza a lógica da castração, o significante fálico é o que vai comandar a relação conceitual, possibilitando a própria conceituação. Passemos a outro contexto da teorização de Lacan para avançar no entendimento dessas questões.
No seminário consagrado aos Problemas cruciais para a psicanálise (1964-1965), Lacan finalmente nomeia o interlocutor do campo da educação e da psicologia de quem extrai a tese sobre a promoção das capacidades mentais da criança através de problemas que ultrapassam seu desenvolvimento
Trata-se de uma retomada do debate iniciado no seminário sobre a angústia, e que nessa conjuntura teórica é particularmente importante para o autor, cuja démarche intenta depurar da causação subjetiva qualquer psicologia e sentido. No seminário sobre os problemas cruciais, verificamos uma questão central, concernente ao ser do sujeito, que
Numa reflexão sobre a relação do significante com o sujeito,
Um significante pode servir para introduzir, na relação com o referente, alguma coisa que tem um nome, que se chama de conceito. E isso é uma relação de conotação. É, portanto, por intermédio da relação do significante com o referente que vemos surgir o significado. (
Podemos verificar, nessa passagem, a ligação entre o conceito e o objeto a - obstáculo à saturação da linguagem, à plena e exata sujeição à linguagem, que não se realiza porque há sempre um resto. Lacan relaciona, então, esse resto da operação de conotação - nunca inequívoca, concreta, exata ou literal - ao referente (
Para corroborar sua elaboração, Lacan recorre a um teórico do campo da aprendizagem,
O que importa não é absolutamente, por certo, ver o que se passa no espírito da criança, certamente alguma coisa que com o tempo se realiza, uma vez que ela se torna o adulto que acreditamos ser, é que se, num certo estado, em certas etapas são para se realçar em sua adequação ao conceito, e aí ficaremos surpresos que alguém como Vygotsky . . . sem tirar mais partido disso, ao ter justamente colocado sua interrogação nos termos que vou dizer, a saber, inteiramente diferentes daqueles de Piaget, se apercebe que mesmo um manejo rigoroso do conceito . . . pode ser de qualquer sorte falacioso, e que o verdadeiro manejo do conceito não é atingido, diz ele, singularmente - e infelizmente sem tirar disso as consequências - senão na puberdade. (
Em nossa hipótese, Lacan extrai importantes consequências dessa articulação entre o conceito e a maturação pubertária, ainda que de forma enviesada e sutil (
Nessa argumentação,
Com efeito, toda a investigação realmente profunda nos ensina a reconhecer a unidade e indissolubilidade da forma e do conteúdo, da estrutura e da função, ensina-nos que cada passo novo no desenvolvimento do conteúdo do pensamento está inseparavelmente unido também à aquisição de novos mecanismos de conduta, com a passagem a uma etapa superior de operações intelectuais. (
Nota-se, assim, o caráter de novidade que a função do pensamento adquire com a puberdade. Vygotsky postula uma unidade dialética entre a forma e o conteúdo na evolução do pensamento, o que contraria as teorias que não reconhecem mudanças qualitativas no pensamento do adolescente. Nessa perspectiva, contesta-se também a afirmação de que no pensamento adolescente separa-se o abstrato do concreto. De modo diverso, o movimento do pensamento na idade de maturação sexual não se caracteriza pelo fato de que o intelecto rompa seus vínculos com a base concreta da qual se origina, mas pela aparição de uma forma completamente nova de relação entre os momentos abstratos e concretos do pensamento, por uma nova forma de sua fusão ou síntese.
Guardadas as devidas ressalvas decorrentes das profundas distinções epistemológicas entre a psicologia histórico-cultural e a psicanálise, realçamos a aproximação entre essa formulação vygotskiana de uma unidade dialética entre o interior e o exterior do pensamento do adolescente e a concepção lacaniana de borda, a estrutura topológica do sujeito que implica uma continuidade entre interior e exterior. A borda é ilustrada por
As observações de Lacan acerca do conceito e do pensamento reverberam o ponto central da abordagem que Vygotsky apresenta da adolescência:
O fato, estabelecido por uma série de investigações, de que o adolescente na idade de transição assimila pela primeira vez o processo de formação de conceitos, sua passagem a uma forma nova e superior de atividade intelectual - ao pensamento em conceitos -, é a chave de todo o problema do desenvolvimento do pensamento. (
Segundo Vygotsky, trata-se do principal fenômeno da idade de transição, o núcleo que aglutina todas as mudanças que se produzem no pensamento do adolescente. A formação dos conceitos constitui um processo complexo, distinto da simples maturação das funções intelectuais elementares. As mudanças experimentadas pelo pensamento do adolescente em seu processo de domínio dos conceitos são, em grande medida, mudanças de índole interna, estrutural e íntima, que não costumam se exteriorizar nem se tornar visíveis ao observador. Essas modificações no pensamento estão conectadas à unidade entre forma e conteúdo, que constituem um só processo integral.
Destaca-se o caráter qualitativo dessas transformações, que promovem um modus operandi novo no intelecto, uma nova função, diferente das anteriores tanto por sua composição e estrutura quanto pelo modo de sua atividade. Vygotsky salienta a passagem qualitativa entre o que compõe o pensamento infantil, as “imagens sincréticas” e os “complexos” e o que se introduz no pensamento adolescente, os conceitos, reiterando que não se trata de um aumento quantitativo dos nexos associativos que constituem as funções elementares, mas sim da passagem a uma função qualitativamente distinta.
Para uma melhor compreensão dos termos utilizados por Vygotsky, mostra-se necessária uma breve digressão. Diferentemente do que
Voltando à problemática aqui tratada,
Na adolescência, a entrada no pensamento conceitual abre para o sujeito a possibilidade da consciência social e política, da meditação existencial e do interesse mais profundo pela música e pelas artes mais abstratas. Ademais, nessa idade, os jovens, em geral, passam a se atrair pela física, pela filosofia e pela lógica. Vygotsky enfatiza que essas transformações e aquisições não podem ser tomadas de forma universal, pois dependem fundamentalmente das circunstâncias históricas, sociais e culturais. Dessa maneira, suas formulações a propósito da formação dos conceitos e de suas consequências emancipatórias e revolucionárias para o pensamento do adolescente devem ser lidas como fórmulas gerais que podem ou não se aplicar em cada particularidade, ou seja, subordinam-se ao “caso a caso”. Se a formação dos conceitos está relacionada à operação da adolescência, pressupõe-se que seus efeitos no pensamento do sujeito dependem do transcurso dessa operação, sempre singular.
A formação dos conceitos na idade de transição desempenha um papel decisivo por permitir ao adolescente adentrar em sua realidade interna, no mundo de suas próprias vivências. Essa função se fundamenta num ponto de continuidade entre interior e exterior, que associamos, por hipótese, ao que
A partir das formulações de
A apreensão do mundo interno dá-se, para o sujeito adolescente, simultaneamente a um deslocamento inédito no plano externo. Nesse sentido,
A fim de clarificar o que chama de “verdadeira natureza do conceito”, Vygotsky afirma que o verdadeiro conceito é a imagem de uma coisa objetiva em sua complexidade. É possível assimilar um conceito ao conhecer o objeto em todos os seus nexos e relações, ao sintetizar verbalmente essa diversidade numa imagem total mediante múltiplas definições. O conceito não inclui somente o geral, mas também o particular e o singular. Distinguindo-se do conhecimento direto do objeto, o conceito é o resultado de uma elaboração racional da experiência, é o conhecimento mediado do objeto - e aqui, mais uma vez, apontamos a consonância com a ideia lacaniana da mediação por um referente externo à linguagem.
O conceito é um sistema de juízos que se manifesta no pensamento lógico. E este, por seu turno, somente se constitui pelo funcionamento dos conceitos - o que remete Vygotsky ao aforismo “a função faz o órgão”. Em seu entendimento, o pensamento lógico é o conceito em ação. Dessa forma, a mudança mais fundamental nas formas do pensamento na adolescência é o domínio do pensamento lógico, que apenas nessa idade de se converte num fato real. A fim de corroborar essa tese, o autor lança mão de estudos experimentais que ilustram a diferença qualitativa entre o pensamento em complexos, na criança, e o pensamento em conceitos, no adolescente, bem como demonstram que até a idade de maturação sexual não há domínio do pensamento lógico. Além disso, tais experimentos comprovam que as crianças pequenas não utilizam conceitos verdadeiros, valendo-se, no máximo, de equivalentes de conceitos em forma de imagens representativas integrais e não diferenciadas. As crianças são capazes de reconhecer a identidade de um mesmo objeto com base em suas percepções anteriores de outro exemplar, mas não o subordinam a um conceito geral.
Nesse cotejamento entre o pensamento infantil e o adolescente, Vygotsky ressalta a aparição do uso das metáforas e das palavras em sentido figurado na fase de transição, o que sinaliza a conquista da combinação complexa entre o pensamento concreto e o abstrato. De acordo com suas observações, as comparações figuradas utilizadas na infância não constituem metáforas verdadeiras, pois não são nada abstratas. No tempo da adolescência, por sua vez, as metáforas se caracterizam por uma relação peculiar entre o abstrato e o concreto, que só se torna possível graças a uma base da linguagem altamente complexa que se verifica nesse período. Com efeito, constata-se que a progressiva incorporação do abstrato no pensamento constitui o fator central do desenvolvimento intelectual na adolescência.
Em vista disso, essa fase da vida também costuma se caracterizar pela larga abertura para o êxito na matemática, correspondente a um processo de introspecção e do domínio gradual do pensamento abstrato. Uma mudança decisiva se opera nesse momento com a introdução do conceito de número, o que é demarcado por Vygotsky. Na infância, o raciocínio matemático funciona por meio das imagens numéricas. Já na adolescência, passa-se para o pensamento em conceitos numéricos, o que garante a abertura para o pensamento lógico na matemática.
É importante destacar que essa reflexão culmina, nesse desenvolvimento teórico, na questão da causalidade. Recorrendo a apontamentos de alguns autores, dentre eles Piaget, Vygotsky realça a passagem do pensamento pré-causal, quando a criança ainda confunde a causa dos fenômenos com a intenção, para o pensamento causal, quando a lógica da causalidade já está em vigor. O autor não desenvolve essa questão e conclui seu trabalho reiterando a função central da formação dos conceitos na idade de maturação sexual em toda a psicologia do adolescente, que se reestrutura sobre uma nova base. A conclusão desse trabalho nos permite compreender melhor o comentário de
Ainda assim, a leitura do estudo de Vygotsky nos permite inferir elementos que ressoam no entendimento lacaniano da puberdade. Esses elementos convergem na ênfase vygotskiana numa unidade dialética entre interior e exterior, que seria indissociável da formação dos conceitos e da função conceitual. Essa função corresponde à conquista do pensamento lógico e da atribuição de causalidade, e tem como suporte uma nova concepção de mundo interno e externo para o sujeito. De modo notável, Vygotsky conecta essas aquisições do intelecto ao plano subjetivo, chegando a tributar “toda a psicologia” subsequente do adolescente a essa nova função. A formação dos conceitos e o pensamento lógico dependem, por sua vez, da maturação sexual, o que esse autor sublinha em muitos momentos de seu trabalho, malgrado não extraia dessas conexões as devidas consequências, como acentua Lacan.
Essa elaboração nos remete à perspectiva lacaniana que concebe o sujeito de um ponto de vista lógico, e não psicológico. Vê-se, então, que as transformações fundamentais ocasionadas pela maturação sexual na puberdade promovem, para ambos os autores - Vygotsky e Lacan -, um deslocamento subjetivo que é da ordem da lógica, não do sentido. É nesse sentido que Lacan (1966/2003) - no resumo do seminário Problemas cruciais para a psicanálise publicado nos Outros escritos - volta a refutar as hipóteses piagetianas sobre pensamento e linguagem e a endossar a perspectiva vygotskiana, afirmando que “Piaget e Vygotsky ilustram, do primeiro para o segundo, o ganho que se obtém ao repelir qualquer hipótese psicológica das relações do sujeito com a linguagem, mesmo quando é da criança que se trata” (p. 206-207). A nosso ver, a referência ao problema do conceito como ponto de inflexão na passagem adolescente deve-se à necessidade de depuração de toda atribuição de sentido na atualização subjetiva que se passa nesse tempo lógico, em que se coloca para o sujeito um saber acerca da sexualidade que é da ordem de um não saber. (
Nessa busca de depuração de qualquer atribuição de sentido,
A estrutura peculiar dessa figura topológica - constituída, segundo Lacan, pela junção de duas bandas de Moebius - mostra o engodo de qualquer psicologia que pressuponha o cogito como a apreensão de um conteúdo, como o envelopamento, pelo sujeito, do conhecimento. Observa-se que as duas cavidades da garrafa representam, ilusoriamente, o macrocosmo que envelopa o sujeito - que é, por seu lado, microcosmos, psique (p. 54). Essa estrutura topológica se distingue, porém, por se configurar por meio de um buraco, de modo que a separação entre suas cavidades não se sustenta. Isso ilustra como interior e exterior estão numa relação complexa de continuidade, suturada por uma falta, o objeto a.
Conforme nossa hipótese, essa figuração é especialmente conveniente para ilustrar aquilo que Vygotsky expõe de modo eloquente em seu texto e que certamente chama a atenção de Lacan: a unidade dialética entre interior e exterior que estrutura o conceito, constituindo, de tal forma, o pensamento lógico (
O termo compreender é para apreendermos nesse gesto mesmo que se chama apreensão e, contudo, permanece irredutível a essa forma substancial da superfície, nesse aspecto de envelope em que ela se apresenta, isso que as mãos podem apreender e que é aí sua forma de apreensão a mais adequada; que não basta acreditar que ela seja, ali, grosseiramente imaginária, de nenhuma maneira redutível ao tangível. Seguramente não, porque se está aí a noção de Begriff mesmo, de conceito, pode se transportar da maneira a mais adequada . . . vocês verão que está aí, certamente, um modo a princípio infinitamente mais sutil que aquele que dá a oposição dos termos extensão e compreensão. (
Podemos conceber, com essa proposição, a formulação do movimento de apreensão conceitual pela topologia da garrafa de Klein. Assim como em pontos ulteriores da obra lacaniana, o conceito, Begriff
Na adolescência, o sujeito se certifica da inconsistência do Outro, o que se dá ao passo de uma operação de extração, da presentificação de um vazio que corresponde à maturação do objeto a. A nosso ver, essa correlação insinua-se na articulação que
Na travessia da infância à idade adulta, o sujeito desliga-se da autoridade familiar e endereça-se ao lugar do Outro em seu sentido mais amplo. O debate entre Lacan e Vygotsky demonstra que a formação do conceito na puberdade é uma ferramenta preciosa nessa transição. Como sugere Lacan, o conceito é o prolongamento do corpo, é o que propicia ao sujeito ir além de um limite, o que viabiliza a expansão de um campo e a invenção do novo. Dito de outro modo, a passagem adolescente - o ultrapassamento de um obstáculo limitador e o encaminhamento a uma posição emancipada no Outro - não se realiza sem um salto no plano do pensamento. É, portanto, um salto lógico, propulsionado por uma falta no corpo, o que vai possibilitar ao sujeito lidar com o não saber inerente ao real, que irrompe de maneira incisiva nesse momento. E o pensamento conceitual pode ser tomado como instrumento de corte capaz de abrir caminho no campo do Outro.
Tese da autora deste trabalho, defendida no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais, sob orientação da professora Ângela Maria Resende Vorcaro, e intitulada O momento-limite conceitual: um estudo sobre as implicações sociais e subjetivas do saber na passagem adolescente (
Podemos encontrar essa proposta de
Tradução nossa da edição utilizada, que é espanhola, dos seguintes títulos: “El desarrollo del pensamiento del adolescente y la formación de conceptos”, em Paidología del adolescente (
Tradução nossa do espanhol: “una concepción correcta de la crisis y la maduración intelectual, que constituyen el contenido del desarrollo del pensamiento en el adolescente” (p. 47).
Tradução nossa do espanhol: “En efecto, toda investigación realmente profunda nos enseña a reconocer la unidad e indisolubilidad de la forma y el contenido, de la estrutura y la función, nos enseña que cada paso nuevo en el desarrollo del contenido del pensamiento está inseparablemente unido también con la adquisición de nuevos mecanismos de conducta, con el paso a una etapa superior de operaciones intelectuales” (p. 54).
Tradução nossa do espanhol: “El hecho, establecido por una serie de investigaciones, de que el adolescente en la edad de transición asimila por primera vez el proceso de formación de conceptos, su paso a una forma nueva y superior de actividad intelectual – al pensamiento en conceptos –, es la clave de todo el problema del desarrollo del pensamiento” (p. 58).
Tradução nossa do espanhol: “La relación entre el contenido y la forma del pensamiento no es la misma que la del agua en relación con el vaso. El contenido y la forma se hallan indisolublemente vinculados, se condicionan recíprocamente” (p. 63).
No alemão, Begriff é “conceito”, “noção”, “ideia”. Já o verbo greifen corresponde a “agarrar”, “pegar em”, “tocar” (um instrumento musical), “meter a mão” (no bolso), entre outros (
This article contains an analysis of Lacan’s relationship between the maturation of object
This article presents a theoretical development extracted from a doctoral research in Psychology
We formulate the hypothesis that the connection between puberty and conceptual thought is concerned with an original proposition of Lacan, consisting of an important contribution to the psychoanalytic approach to adolescence. The relationship between pubertal maturation - concerning the incidence of the organic real in the body - and the assimilation of concepts, in a logical time marked by the castration anxiety, which concerns the association between a capacity of thought and the emergence of an emptiness. It is a novelty that presents itself in the field of knowledge at a time when the not-knowing is imposed on the subject in a radical way. Understanding this Lacanian formulation about puberty requires an examination of the theoretical framework on which it is built.
In
According to
Thus,
In his brief foray into the pedagogical debate,
In helping a child deal with these problems, only in helping, I mean, something is done that not only has an effect of precocious maturation, an effect of haste in mental maturation, but that, in certain so-called sensitive periods, . . . enables obtaining real effects of opening or triggering. Some activities of understanding have, in certain fields, absolutely exceptional effects of fruitfulness. (
In an allusion to “authors whose words are even more interesting to preserve” (p. 282), since they are unaware of their contributions to Psychoanalysis, Lacan evokes the question of puberty, which is surely one of the “so-called sensitive periods” mentioned (p. 282):
It is deserving, given the fact that a given pedagogist has formulated that there is only real access to the concepts from the age of puberty, that we include our view, that we have meddled in it. There are thousands of pieces of sensitive evidence that the moment from when the functioning of the concept is really initiated, and that the authors call - in this case, in a purely fortuitous homonymity with the word complex, which we employ -
In our hypothesis, which enables the understanding of concepts, is precisely the emergence of an emptiness related to the subject’s
Immediately after this proposition,
We need to ask what is the concept according to
The maturation of object
During the seminar dedicated to the
It is a resumption of the debate initiated during the seminar on
While reflecting on the relationship of the signifier with the subject,
A signifier can serve to introduce, within the relationship with the referent, something that has a name, which is called concept. And this is a relationship of connotation. It is, therefore, through the relationship of the signifier with the referent that we see the signified emerge. (
Within this passage we can observe the connection between the concept and the object
To corroborate his elaboration, Lacan resorts to a theorist from the field of learning,
What is important, certainly, is absolutely not seeing what transpires in the child’s spirit, surely something that is realized in time, once they become the adult that we believe to be, is that if, in a certain state, in certain steps are to highlight in its adequacy to the concept, and then we will be surprised that someone such as Vygotsky . . . without taking more advantage of that, precisely in having posed his questioning in the terms that I will say, namely, entirely different from those of Piaget, it is perceived that even a rigorous management of the concept . . . can be anyway fallacious, and that the real management of the concept is not reached, he says, uniquely - and unfortunately without taking from that the consequences - if not at puberty. (
In our hypothesis, Lacan extracts important consequences from making this relationship between the concept and pubertal maturation, albeit in a biased and subtle manner (
In this argument,
In fact, all the really thorough research teaches us to recognize the unity and indissolubility of the form and content, and of the structure and function, that teaches us that each new step in developing the content of thought are inseparably united, and also to the acquisition of new mechanisms of conduct, with the transition to a higher stage of intellectual operations. (
Thus, the character of novelty that the function of thought acquires with puberty is observed. Vygotsky posits a
While considering the deep epistemological distinctions between Cultural-historical Psychology and Psychoanalysis, we highlight the approach between this formulation, by Vygotsky, of a dialectic unity between the interior and exterior of adolescent thought and the Lacanian concept of
Lacan’s observations regarding the concept and the thought reverberate the central point of Vygotsky’s approach to adolescence in this context:
The fact, established by a series of investigations, that the adolescent at the transition age assimilates the concept formation process for the first time, the passage to a new and superior form of intellectual activity - to thinking in concepts -, is the key to the whole problem of the development of thought. (
According to Vygotsky, this is the main phenomenon of the transition age, the core that unites all changes produced in adolescent thought. Concept formation is a complex process, distinct from simple maturation of elementary intellectual functions. The changes experienced by adolescent thought in the process of learning concepts are largely changes of an internal, structural, and intimate nature that usually are not externalized or made visible to the observer. These changes in thought are connected to the unity between form and content, which constitute one integral process.
The qualitative character of these transformations should be noted, which promote a new
In order to better understand the terms used by Vygotsky, a brief digression is necessary. Differently from that which
Resuming the issue addressed here,
During adolescence, the transition to conceptual thought opens the possibility of social and political consciousness, existential meditation, and deeper interest in Music and more abstract arts for the subject. Furthermore, at this age, young people generally begin to be attracted by Physics, Philosophy and Logic. Vygotsky emphasizes that these transformations and acquisitions cannot be taken universally, as fundamentally they depend on historical, social and cultural circumstances. Thus, his formulations about the formation of concepts and their emancipatory and revolutionary consequences for the adolescent’s thought should be read as general formulas that may or may not apply to each peculiarity, i.e., they are subordinated to a “case by case” basis. If the formation of concepts is related to the operation of adolescence, it is assumed that its effects on the subject’s thought depend on the course of this operation, which is always singular.
The formation of concepts at the age of transition has a decisive role as it enables adolescents to enter their internal reality, the world of their own experiences. This function is founded on a point of continuity between the interior and exterior, which we associate, by hypothesis, to what
Based on the formulations of
The apprehension of the internal world occurs, for the adolescent subject, simultaneously to an unprecedented shift in the external aspect. Accordingly,
In order to clarify what he calls the “true nature of the concept,” Vygotsky says that the true concept is the image of an objective thing in its complexity. It is possible to assimilate a concept by knowing the object, in all its connections and relationships, by verbally synthesizing this diversity in a total image through multiple definitions. The concept includes not only the general, but also the particular and singular. Distinguished from direct knowledge of the object, the concept is the result of a rational development of the experience, it is the mediated knowledge of the object - and here, once again, we point out the agreement with the Lacanian idea of mediation as a referent that is external to language.
This concept is a system of judgments that is manifested in logical thought. And this, on the other hand, is only constituted by the functioning of the concepts - which refers Vygotsky to the aphorism, “the function makes the organ.” In its understanding, logical thought is the concept in action. Thus, the most fundamental change in the forms of thought in adolescence is the command of logical thought, which only becomes a real fact at this age. In order to corroborate this thesis, the author resorts to experimental studies that illustrate the qualitative difference between thinking in complexes, in childhood, and thinking in concepts, in adolescence, and studies that demonstrate that until the age of sexual maturation there is no command of logical thought. Moreover, such experiments show that small children do not use true concepts; instead they mostly use equivalents of concepts in the form of integral and non-differentiated representative images. Children are able to recognize the identity of a same object based on their previous perceptions of another one, but they do not subordinate it to a general concept.
While considering this comparison between child and adolescent thought, Vygotsky points out the appearance of the use of metaphors and figurative words at this transition stage, which signals the acquisition of a complex combination between concrete and abstract thought. According to his observations, the figurative comparisons employed during childhood are not true metaphors, because they are absolutely not abstract. During adolescence, on the other hand, metaphors are characterized by a peculiar relationship between the abstract and the concrete, which only becomes possible thanks to a highly complex language base that is observed during this period. In fact, the progressive incorporation of the abstract into thought is the central factor in intellectual development during adolescence.
Therefore, this stage of life is usually also characterized by a major opening to success in mathematics, corresponding with a process of introspection and gradual command of abstract thought. A decisive change occurs at this time with the introduction of the concept of numbers, which is established by Vygotsky. During childhood, mathematical reasoning works by means of numerical images. During adolescence, there is a transition towards thought in numerical concepts, which ensures the opening to logical thought in mathematics.
It is important to note that this reflection culminates, in this theoretical development, within the issue of causality. Resorting to arguments from some authors, including Piaget, Vygotsky underlines the transition from pre-causal thought - when the child still confuses the cause of phenomena with the intention - to causal thought, when the logic of causality is already in place. This author does not develop this issue and concludes his work re-emphasizing the central function of concept formation at the sexual maturation age in the whole psychology of the adolescent, which is restructured on a new basis. The conclusion of this work enables us to better understand the commentary of Lacan (1964-1965) who, in praising the Vygotskyan
Nonetheless, reading this study by Vygotsky enables us to infer elements that resonate in the Lacanian understanding of puberty. These elements converge in the Vygotskyan emphasis on a dialectic unity between the interior and exterior, which would be inseparable in terms of concept formation and conceptual function. This function corresponds to the acquisition of the command of logical thought and of the attribution of causality, and is supported by a new conception of the internal and external world for the subject. It is noteworthy that Vygotsky connects these acquisitions of the intellect to the subjective plane, even attributing “all subsequent psychology” of the adolescent to this new function. The formation of concepts and the logical thought depend, on the other hand, on sexual maturation, which this author emphasizes in several parts of his work, despite not having drawn the proper consequences from these connections, as Lacan points out.
This elaboration leads us to the Lacanian perspective that conceives the subject based on a logical point of view, and not a psychological one. Thus, it is observed that the fundamental transformations brought by sexual maturation during puberty promote, according to both authors - Vygotsky and Lacan -, a subjective shift that is of alogical nature, not of sense one. It is in this sense that
In this search for depuration of any attribution of sense,
The peculiar structure of this topological figure - was constituted, according to Lacan, by merging two Moebius bands - showing the trick of any psychology that assumes the
According to our hypothesis, this figuration is especially convenient to illustrate that which Vygotsky exposes so eloquently in his text and that certainly draws Lacan’s attention: the dialectic unity between the interior and exterior that structures the concept, thus constituting logical thought (
The term comprehension is for us to apprehend in this very gesture called apprehension and, however, it remains irreducible to this substantial form of the surface, in this aspect of envelope in which it presents itself; this which the hands can apprehend and that its form of apprehension is the most adequate; that it is not enough to believe it is, there, roughly imaginary, by no means reducible to the tangible. Surely not, because therein lies the very notion of
We can conceive, with this proposition, the formulation of the movement of conceptual apprehension by the topology of the Klein bottle. As in further points of Lacanian work, the concept,
During adolescence, the subject verifies the inconsistency of the Other, which is conducted in an operation of extraction, of presentification and of an emptiness that corresponds to the maturation of object
During the transition from childhood to adulthood, the subject is disconnected from family authority and shifts to the place of the Other in its wider sense. The debate between Lacan and Vygotsky demonstrates that concept formation during puberty is a precious tool in this transition. As suggested by Lacan, the concept is an extension of the body; it is that which enables the subject to go beyond a limit, which enables the expansion of a field and the invention of the new. In other words, the adolescent transition - the overcoming of a limiting obstacle and the shift to an emancipated position in the Other - is not accomplished without a leap in the plane of thought. It is, therefore, a logical leap, propelled by a lack in the body, which will enable the subject to deal with the not-knowing that is inherent in the real that bursts incisively at this time. And the conceptual thought can be assumed as a cutting instrument capable of clearing the way in the field of the Other.
Thesis of the author of this work, which was presented in the Graduate Program in Psychology of the Universidade Federal de Minas Gerais, under the mentorship of Professor Ângela Maria Resende Vorcaro and entitled O momento-limite conceitual: um estudo sobre as implicações sociais e subjetivas do saber na passagem adolescente (
We find this proposal of
Our translation of the edition used, which is Spanish, of the following titles: “El desarrollo del pensamiento del adolescente y la formación de conceptos”, in Paidología del adolescente. (1930-1931/2012).
Our translation from Spanish: “una concepción correcta de la crisis y la maduración intelectual, que constituyen el contenido del desarrollo del pensamiento en el adolescente.” (p. 47).
Our translation from Spanish: “En efecto, toda investigación realmente profunda nos enseña a reconocer la unidad e indisolubilidad de la forma y el contenido, de la estrutura y la función, nos enseña que cada paso nuevo en el desarrollo del contenido del pensamiento está inseparablemente unido también con la adquisición de nuevos mecanismos de conducta, con el paso a una etapa superior de operaciones intelectuales.” (p. 54).
Our translation from Spanish: “El hecho, establecido por una serie de investigaciones, de que el adolescente en la edad de transición asimila por primera vez el proceso de formación de conceptos, su paso a una forma nueva y superior de actividad intelectual – al pensamiento en conceptos –, es la clave de todo el problema del desarrollo del pensamiento.” (p. 58).
Our translation from Spanish: “La relación entre el contenido y la forma del pensamiento no es la misma que la del agua en relación con el vaso. El contenido y la forma se hallan indisolublemente vinculados, se condicionan recíprocamente.” (p. 63).