Desigualdade no acesso à terra e insegurança alimentar e nutricional: um olhar sobre os marcos políticos, legais e institucionais da segunda metade do Império até o primeiro governo de Getúlio Vargas (1850-1945)

Autores

DOI:

https://doi.org/10.11606/issn.2596-3147.v2i1p32-75

Palavras-chave:

Insegurança Alimentar e Nutricional, Formação social brasileira, Políticas sociais, Questão fundiária, Direito Humano à Alimentação Adequada

Resumo

O artigo tem como centro de análise o debate dos marcos históricos situados entre o período de 1850 a 1945, ou seja, do fim da Monarquia até o primeiro governo Vargas, que impactaram no desenvolvimento de políticas públicas e sociais para a redução da fome e da pobreza no Brasil. O objetivo desta reflexão é compreender as permanências na estrutura social brasileira que justificam a manutenção da insegurança alimentar e nutricional da população, por meio de levantamento bibliográfico e documental. Foram elencados marcos políticos, legais e institucionais que explicitassem a questão do acesso à terra e das novas relações de trabalho que surgiram nesse período, tais como a Lei de Terras de 1850, que contribuiu no processo de transição do sistema mercantil exportador para o modelo político/econômico capitalista, ampliando as desigualdades no acesso à terra e fortalecendo os grandes latifúndios agrários exportadores; a Constituição de 1891, considerada como marco fortalecedor das oligarquias agrárias; e as primeiras políticas públicas de alimentação e nutrição do governo Vargas, geradas pelos estudos de medicina social que justificavam o fenômeno da fome e da desnutrição através do viés biológico da nascente ciência da nutrição, contornando a questão estrutural do acesso à terra. O debate final traz à tona elementos da formação social brasileira que permitem o entendimento da exclusão do acesso à terra enquanto fator estruturante do fenômeno da insegurança alimentar e nutricional.

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Biografia do Autor

  • Vanessa Daufenback, Universidade de São Paulo, Faculdade de Saúde Pública

    Socióloga e nutricionista, doutoranda em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, mestre em Sociologia pela Universidade Estadual Paulista e especialista em saúde da família pela Universidade Federal do Paraná. 

  • Juliana Giaj Levra de Jesus, Universidade de São Paulo

    Mestranda do programa de Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP) com bolsa CAPES. Especialista em Saúde da Família pela Residência multiprofissional em Saúde da Família da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/FIOCRUZ). Nutricionista pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP). Foi aluna bolsista pelo programa Ciências Sem Fronteiras da Illinois State University em Normal, Illinois, Estados Unidos (2013-2014). Possui interesse nas áreas de Atenção Primária a Saúde (APS), Saúde da Família, Promoção da Saúde, Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) e Culinária.

  • Letícia Machado, Universidade de São Paulo

    Bacharela e Licenciada em Geografia pela Universidade de São Paulo -USP- (2017).Participou como bolsista de iniciação científica entre os anos de 2012 a 2014 do projeto de pesquisa: Geografia e Gênero: as novas e velhas dinâmicas no campo brasileiro com ênfase na expansão da cana de açúcar no século XXI, sob orientação da professora Titular Rosa Ester Rossini. Foi monitora da disciplina Geografia Agrária I, nos anos de 2015 e 2016. Elaborou o trabalho final de graduação na temática da Agricultura urbana, realizando uma pesquisa de caráter etnográfico, junto aos agricultores urbanos do extremo leste do município de São Paulo. Atualmente é mestranda do programa de Pós-Graduação em Saúde Pública, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

  • Cláudia Maria Bógus, Universidade de São Paulo

    Cláudia Maria Bógus possui graduação em Pedagogia (1987) pela Faculdade de Educação da USP, Especialização em Saúde Pública (1988), Mestrado (1992) e Doutorado (1997) em Saúde Pública e Livre-Docência (2009) em Promoção da Saúde pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Participou do Programa de Formação em Saúde Internacional da Organização Pan-Americana de Saúde em WDC (EUA) em 2001. É docente da Faculdade de Saúde Pública da USP desde 2004 e credenciada como orientadora de Mestrado e Doutorado junto ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da USP desde 2005 e junto ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Global e Sustentabilidade desde 2013. Atua na área de saúde coletiva e saúde pública com ênfase em promoção da saúde, educação em saúde, participação social em saúde e políticas públicas em saúde.

  • Maria Cristina da Costa Marques

    Professora Doutora do Departamento de Gestão, Política e Saúde, Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Doutorado e Mestrado em História das Ciências/História Social pelo Departamento de História, FFLCH - USP. Graduada em Enfermagem com Especialização em Saúde Pública. Estágio de Formação em Demografia Histórica na Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales/ Paris/França e de Doutorado Sanduíche na London School of Tropical Medicine. Experiência docente, ensino, pesquisa e cooperação técnica em saúde coletiva, história da saúde e ciências humanas em saúde, com interesse em políticas públicas, proteção à saúde com ênfase em vigilância e história social da saúde.

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Publicado

2020-09-17

Edição

Seção

Dossiê II Simpósio Internacional de Pesquisa em Alimentação

Como Citar

Desigualdade no acesso à terra e insegurança alimentar e nutricional: um olhar sobre os marcos políticos, legais e institucionais da segunda metade do Império até o primeiro governo de Getúlio Vargas (1850-1945). (2020). Revista Ingesta, 2(1), 96-117. https://doi.org/10.11606/issn.2596-3147.v2i1p32-75