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Artigo discute sobre tutela, desafios e direitos de cidadania em relação a “loucos e índios”

Release de Margareth Artur para o Portal de Revistas da USP

A ideia que nos surge à mente quando se fala em tutela é a de proteção, amparo e auxílio. O artigo da Revista de Direito Sanitário enfoca a palavra em relação a dois segmentos sociais que nos mostram uma outra visão: a de manipulação, de exclusão social, de violação de direitos humanos, tais como os índios e os chamados “loucos” , excluídos, à margem da sociedade, “tanto em função das violações de direitos sofridas como pelo enfrentamento à normatização, normalização e estigmatização da diversidade“. Os autores procuram discutir esses dois segmentos a partir do reconhecimento dos direitos de cidadania dos povos indígenas e das pessoas com transtornos mentais, “ambos possíveis a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988“.

A tutela como manipulação e confinamento iniciou-se com a catequização religiosa, “com a conversão cristã e da ‘domesticação”para o trabalho“. No século XVIII, “toda internação dever ser precedida de interdição civil, pois a loucura passava a ser entendida como incapacitante para a vida civil“, uma vez patente a intolerância de uma sociedade que privilegiava a soberania do intelecto. Apesar de constituirem-se como movimentos sociais distintos, “loucos” e índios reivindicam a “construção e afirmação de uma cidadania fundada no reconhecimento da pluralidade” e da diversidade. Se desde a invasão portuguesa e de outros povos europeus os povos indígenas eram concebidos como insanos, desalmados e intelectualmente inferiores, “a significação de loucura como doença é algo recente na história ocidental.

Desse modo, ainda mais recente – em consonância com a Carta de 1988 – é a esteira legislativa que inaugura novos paradigmas de direitos desses dois segmentos cuja participação foi historicamente afastada dos processos sociais. A Lei Brasileira de Inclusão das Pessoas com Deficiência institui direitos de liberdade aos “loucos”, secularmente alijados, restituindo-lhes a capacidade civil. Em relação à experiência do sofrimento mental, o excesso de medicamentos, o isolamento e os tratamentos com aparelhos de choque, contudo, ainda são medidas existentes atualmente, e “a ocorrência especialmente das duas últimas retoma a idéia que a única possibilidade de existência para sujeitos internados é a total aniquilação da identidade pessoal, a mortificação do eu“.

Ressalta-se a reforma psiquiátrica, na intenção de recompor e inserir o sujeito em uma assistência de saúde mental tanto fora dos hospitais, “visando serviços em rede com base comunitária“quanto em outros contextos hospitalares, fatores que deram origem a uma política nacional de saúde mental. Em relação à população indígena, ressalte-se a luta pelo direito dos povos indígenas manterem “suas próprias organizações sociais, usos, costumes, tradições, territórios e capacidade de autodefesa“. Apesar de maior participação indígena na sociedade, o fim jurídico da tutela da União sobre povos indígenas “não significa o fim de formas de exercício de poder, de moralidade e de interação que se poderia qualificar de tutelares“.

Porém, os  antigos paradigmas convivem com novas práticas sociais, estimulando a interação e autonomia como fatores inerentes da cidadania indígena. De outro modo, o trabalho e a geração de renda se constituem um dos eixos emancipatórios concebidos pela Reforma Psiquiátrica, antes de cuja lei já havia sido promulgada a Lei n. 9.867/1956, que “dispõe sobre a criação e o funcionamento de Cooperativas Sociais, visando à integração social dos cidadãos”. Emancipação e autonomia, seja das pessoas com transtornos mentais, seja dos povos indígenas, são imprescindíveis para a inclusão dos mesmos como cidadãos respeitados e agentes participativos da sociedade.

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Artigo

JACINTO, A; ASSIS, A; MACDOWELL, P; e  DUARTE, T. Índios e loucos: sobre tutela, reconhecimento de direitos e desafios para a efetivação da cidadania no campo da saúde mental. Revista de Direito Sanitário, v. 19, n. 2, p. 14-35, 2018. INSS: 2316-9044. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2316-9044.v19i2p14-35. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rdisan/article/view/152557. Acesso em: 14 jan. 2019.

Contatos

Andréa Borghi Moreira Jacinto – Doutora em Antropologia pela Universidade de Brasília, mestre em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas, graduada em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas, analista da técnica de Políticas Sociais  vinculada ao Ministério da Saúde e, atualmente, à Fundação Nacional do Índio. borghi1@yahoo.com.br

Adolpho Daltin Assis – Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba, mestre profissional no tema “Adolescente em Conflito com a Lei” pela Universidade Bandeirantes/Anhanguera, especialista em Gestão de Redes de Atenção à Saúde pela Fundação Oswaldo Cruz/Ministério da Saúde, graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e analista técnico de Políticas Sociais no Distrito Sanitário Especial Indígena Potiguara, Secretaria Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, João Pessoa-PB. danieladolpho@gmail.com

Pedro de Lemos MacDowell – Graduado em Ciências Sociais e mestre em Antropologia Social pela Universidade de Brasília (UNB); especialista em Saúde Mental, Álcool e outras Drogas pela UNB; e analista técnico de Políticas Sociais no Distrito Sanitário Especial Indígena Guamá-Tocantins, Secretaria Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Belém-PA. pedro.macdowell@gmail.com

Taia Duarte Mota – Graduada e mestre em Enfermagem pela Universidade de São Paulo (USP), analista técnica de Políticas Sociais vinculada ao Ministério da Saúde, e, atualmente,  ao Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura. taiaduarte80@gmail.com

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