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Estudo mostra a influência da cultura na questão da obesidade – estamos cuidando da saúde ou atendendo a padrões estéticos?

Release de Margareth Artur para o Portal de Revistas da USP

Quando se fala em obesidade, é preciso se despir de preconceitos, pois a primeira ideia que nos vêm à mente é de alguém fora do peso considerado normal, geralmente descontrolado, que se deixa levar pela gula. Mas a pergunta capaz de mudar essa primeira impressão é: o que leva alguém à obesidade? Condição de saúde que afeta 18,9% dos adultos brasileiros, a obesidade comporta várias causas e é uma situação complexa a ser analisada com profundidade, buscando-se compreender quais comportamentos são vividos como “cuidado” pelas pessoas obesas e quais são as implicações disso para a prática profissional em saúde. O artigo publicado na revista Saúde e Sociedade realizou uma pesquisa com sete homens e cinco mulheres, mostrando que hábitos alimentares podem ser o resultado de conflitos internos que acabam por interferir na dieta e na atividade física.

Para a abordagem pretendida, os autores introduzem no artigo uma reflexão  sobre o corpo obeso, baseados no referencial filosófico do francês Merleau-Ponty, que afirma: a obesidade expressa formas de ser; por meio do corpo o homem vivencia o mundo – o corpo carrega valores e percepções. Os resultados da pesquisa mostram a tomada da decisão de cuidar-se ou não se cuidar e os fatores que influenciam essa decisão; a “vivência das formas de cuidado, revelando possibilidades e dificuldades encontradas na execução do cuidado” e “emagrecimento como opção ou obrigação, questionando motivações para cuidar-se pela saúde ou atender a padrões estéticos“. A obesidade, segundo os autores, é doença cuja natureza e tratamento são complexos.

Chama-se a atenção para a urgência de políticas públicas capazes de proporcionar e estimular estilos de vida mais saudáveis, pois a obesidade ” deve ser pensada como fenômeno social“, na reflexão necessária quando se quer reduzir o peso, com saúde, descartando “exercícios físicos extenuantes, medicamentos sem prescrição e indicadas da mídia, gerando frustração e tristeza“. Enfrentar a obesidade é priorizar a particularidade do “eu“, o “corpo próprio”, segundo Merleau-Ponty, “que carrega os valores e as percepções do ser“. A pessoa obesa inicia o processo de enfrentamento olhando para seu corpo e não percebendo a obesidade como algo a ser cuidado.

Em um segundo momento, a obesidade passa a fazer parte desse corpo, a consciência desperta para a necessidade de cuidados. Além disso, as doenças associadas, como diabetes e hipertensão, parecem mais fáceis de encarar-se do que a obesidade. Esse processo de perceber o corpo obeso é perpassado por sentimentos, e os hábitos alimentares refletem aspectos emocionais. Mudar hábitos significa mudar sentimentos, o que é um processo difícil e lento. Os médicos recomendam alimentação mais controlada, menos sal, atividade física, mas os autores afirmam haver questões de outra natureza perpassando essa ação, como sentimentos, crenças, luto, etc.

Outro fator de influência na obesidade é a ansiedade, apontada como responsável pelo aumento da vontade de alimentar-se. Aspectos emocionais revelaram ter influência na alimentação de forma compulsiva. Muitas vezes, os pacientes sofrem um tratamento preconceituoso e punitivo, como se fazer dieta não fosse uma escolha, e sim uma obrigação. Combater a obesidade tem como objetivo melhorar a saúde e a autoestima ou é apenas uma obrigação de cumprir padrões que atendem ao ideal de corpo magro? Nesse contexto os autores questionam: “a equipe de saúde tem a missão de prescrever incessantemente tratamentos e dietas? Ou acolher essa pessoa e respeitar sua forma de viver e suas escolhas?“.

O filósofo Merleau-Ponty aponta que saúde e doença “são nuances da forma de ser de um corpo“, fazem parte da vida.  Existem muitas possibilidades de olhar e tratar a obesidade, e, muitas vezes, as pessoas escolhem não emegrecer, “pois têm outras prioridades em sua vida“. E, concluindo, os autores afirmam que as escolhas precisam ser respeitadas, e ao dirigirmos a atenção às pessoas obesas em relação aos serviços de saúde, é necessário que seja de maneira “integral e considerar as vivências e idiossincrasias de cada um“. 

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Artigo 

ARAUJO, F. M.; GONZÁLEZ, A.; SILVA, L.; GARANHANI, M. L. Obesity: possibilities of developing and care practices. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 28, n. 2, p. 249-260, 2019. ISSN: 10.1590. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-12902019170152. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/sausoc/article/view/160421. Acesso em: 10 dez. 2019. 

Contatos

Flávia Maria Araujo – Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Estadual de Londrina. e-mail: araujoflavia.m@gmail.com

Alberto Durán González – Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Departamento de Saúde Coletiva, Universidade Estadual de Londrina. e-mail: betoduran80@gmail.com

Lucia Cecilia da Silva – Programa de Pós-Graduação em Psicologia,  Universidade Estadual de Maringá Maringá. e-mail: luciacecilia@hotmail.com

Mara Lúcia Garanhani – Departamento de Enfermagem, Universidade Estadual de Londrina. e-mail: maragara@hotmail.com

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