Chamada - Seção Especial cadernos de campo 26 - "Adversidades no fazer antropológico"

2017-10-06

Refletir sobre o trabalho de campo no ofício antropológico é pensar, quase sempre, em desafios. Estudar pessoas, grupos e fenômenos próximos ou distantes é um processo reflexivo e político constantemente tensionado, de modo que os desafios nele contidos estão associados às especificidades de cada campo e, também, de cada pesquisadora e pesquisador. Embora a pesquisa de campo seja um momento de profundo aprendizado, são escassas as discussões analíticas sobre possíveis adversidades, riscos e abusos. Nesse escopo, se ir a campo é um movimento fundamental na produção do conhecimento e do próprio fazer antropológico, ele ainda tende a ser romantizado por diversos autores em textos de antropologia.

Pensando nisso, a comissão da Seção Especial da Revista Cadernos de Campo propõe para a próxima edição (n.26, 2018) o tema Adversidades no fazer antropológico, com inspiração na discussão metodológica e epistemológica incitada no texto Rape in The Field: reflections from a survivor. (In: "Taboo: Sex, Identity and Erotic Subjectivity in Anthropological Fieldwork", orgs. D. Kulick e M. Wilson, 1995), cuja tradução acompanhará essa mesma edição da revista. Neste texto, a antropóloga descreve e analisa uma série de eventos abusivos vivenciados por ela durante seu trabalho de campo na Etiópia, cometidos por seu então assistente de campo. A partir destes abusos – que perpassam questionamentos da sua autoridade enquanto pesquisadora, assédios, jogos psicológicos, estupro à mão armada e ameaças - a autora incita reflexões que levem em consideração relações de poder, o diferenciado acesso às pessoas na realização do trabalho de campo e os efeitos dessas adversidades na produção e circulação do conhecimento produzido. Em negociação com a editora acerca da preservação das identidades e publicação do texto, a antropóloga decide manter as descrições que situam, localizam e marcam acontecimentos e pessoas, optando então por ela própria adotar um pseudônimo, Eva Moreno.

Contudo, esta Seção Especial não tem como objetivo receber apenas textos sobre experiências similares ao texto que serviu de inspiração, mas tem como proposta proporcionar um espaço de debates sobre as adversidades encontradas durante a pesquisa de campo, reunindo contribuições dedicadas a discutir questões éticas e metodológicas durante e após a realização das pesquisas, estratégias textuais utilizadas para tratar de assuntos delicados, implicações de nossas descrições para os sujeitos de nossas pesquisas, inviabilização da pesquisa e outras temáticas sensíveis à relação entre antropóloga/o, pesquisa de campo e sujeitos com os quais estabelecemos interlocução.

Serão aceitos textos também com pseudônimos, como ferramenta metodológica, que ensejem discussões éticas quanto às formas de publicação e circulação dos trabalhos etnográficos, bem como reflitam sobre o caráter ficcional das produções antropológicas.

As contribuições podem ser enviadas até o final de dezembro pelo sistema eletrônico da revista  no e-mail cadcampo@gmail.com

As normas para submissão dos textos são as mesmas válidas para artigos e encontram-se disponíveis nas diretrizes para autores