Prorrogação de prazo: Chamada para o nº 32 — Itinerários caribenhos: rotas traçadas e cartografias por vir

2021-09-02

Itinerários caribenhos: rotas traçadas e cartografias por vir

            Partindo-se da constatação, no presente, de um momento privilegiado de recepção de obras caribenhas no Brasil, este número da Criação & Crítica pretende se colocar no limiar entre duas temporalidades interligadas: a primeira reivindica a celebração dos caminhos críticos percorridos até aqui, que estão em vias de fragilizar a assertiva, feita em outro tempo histórico, de que “a bibliografia sobre as Antilhas é ainda muito escassa no Brasil” (FIGUEIREDO, 1998, p. 11). Já a segunda busca reunir ainda mais vozes, dentro e fora do país, com vistas a abrir espaço para outras cartografias possíveis do arquipélago caribenho.

            Nos últimos anos, publicações cada vez mais numerosas de obras antilhanas no Brasil, tanto no âmbito literário quanto no teórico, testemunham um fôlego renovado na recepção crítica e tradutória de produções provenientes das ilhas do Caribe, em toda sua diversidade linguística, sociocultural e étnica. No que se refere a traduções, chama a atenção um número considerável de retraduções, algo notável em um cenário ainda limitado de livros vertidos para o português. Em 2019, foi publicado Eu, Tituba: bruxa negra de Salem (Rosa dos Ventos), de Maryse Condé, vinte e dois anos após a primeira tradução do romance. No ano seguinte, saiu em nova tradução a obra Senhores do orvalho (Carambaia), do haitiano Jacques Roumain.Também nesse período, vieram a público retraduções dos clássicos Discurso sobre o colonialismo (Veneta), de Aimé Césaire e Pele negra, máscaras brancas (Ubu editora), de Frantz Fanon.

            No campo das traduções inéditas, em 2020, Estilhaços – antologia de poesia haitiana contemporânea (Selo Demônio Negro, org. Henrique Provinzano Amaral) apresentou a primeira antologia poética haitiana em edição bilíngue (francês-português) no Brasil. Em 2021, Cartas a uma negra (Todavia), de Françoise Ega, revelando cartas escritas, mas nunca postadas, pela martinicana à brasileira Carolina Maria de Jesus. Também foi publicada a antologia Contos de noite e dia nas Antilhas (Figura de Linguagem), de Ina Césaire, em tradução de Jéssica Pozzi e Samanta Siqueira. No campo crítico, destacam-se as publicações, no corrente ano, de Tradução em (ent)revista: Simone Schwarz-Bart e as tradutoras brasileiras, de autoria de Vanessa Massoni da Rocha e Com a palavra, a memória: La Lézarde de Édouard Glissant, de Janaína de Azevedo Bispo.

            Para além do universo de expressão francesa, também se pode aludir à publicação recente de obras provenientes de outros territórios e línguas do Caribe. A título de exemplo, do inglês, foi traduzida a Autobiografia da minha mãe (Alfaguara), de Jamaica Kincaid, escritora proveniente de Antigua e Barbuda. Do espanhol, saiu Nocaute: 6 poetas/Cuba/hoje (Jabuticaba), além de outras antologias poéticas editadas pela Malha Fina Cartonera.

            Em consonância com o crescimento expressivo das publicações em livro e dos trânsitos culturais, tem aumentado o número de trabalhos (artigos, dissertações e teses) e de eventos acadêmicos dedicados a temas caribenhos. Isso configura, no Brasil, um cenário inédito, que vem coadunando pesquisadores de diferentes gerações em torno de abordagens pautadas pela busca do “diversel contra o universel” (CHAMOISEAU, 2014, p. 13) e capazes de criar “o novo a partir de raízes múltiplas” (MAXIMIN, 2006, p. 16). A partir desse momento, abre-se um novo ciclo, em que os múltiplos hibridismos, atravessamentos e transversalidades contribuem para a assimilação das poéticas do Diverso e do Todo-Mundo (GLISSANT, 2005; 1997).

            Nesse contexto, ganham especial relevo as perspectivas pós-coloniais e decoloniais (MIGNOLO, 1996, 2017), ferramentas agudas para a análise das manifestações literárias do Caribe à luz de seu amplo leque de elementos culturais, históricos, sociais e identitários. Também estão em pauta as confluências entre poética e política, constitutivas da obra de numerosos autores caribenhos, entre eles Édouard Glissant (DAMATO, 1995).

            Nessa chamada, são bem-vindos, também, trabalhos com textos e outras manifestações culturais que desafiam categorizações estritas, a exemplo de ensaios e manifestos, literaturas orais (ou a chamada “oralitura”). Também nos interessamos pelas relações que os textos verbais suscitam e mantêm com outras manifestações artísticas tipicamente caribenhas, a exemplo da pintura dita naïf, comum no Haiti, e do laghia, dança-luta aparentada da capoeira.

            Para além do caráter comemorativo voltado para as relações Brasil-Caribe, reitera-se que este número busca acolher trabalhos de pesquisadores provenientes de diversos espaços e interessados nos itinerários caribenhos. Nesse sentido, valorizam-se variadas perspectivas teóricas e críticas capazes de espelhar a multiplicidade de um mundo em Relação (GLISSANT, 1990).

            Eis alguns eixos temáticos possíveis:

  • Recepção de obras caribenhas (traduzidas ou não) no Brasil;
  • Interfaces culturais Brasil-Caribe;
  • Perspectivas socio-históricas (pós)coloniais e decoloniais;
  • Multilinguismo, diglossia e “Oralituras”; 
  • Exílios, diásporas e migrações;
  • Textos e espelhamentos identitários;
  • Relações tradutórias Brasil-Caribe;
  • Negritude, Crioulidade, Crioulização, Antilhanidade e outros discursos em relação.

A revista aceita artigos acadêmicos escritos em português, francês, espanhol e inglês, bem como resenhas, entrevistas, traduções e exercícios de estilo (textos na fronteira entre o crítico e o literário).

As contribuições devem ser enviadas através do site, de acordo com as normas da revista, até 15/02/2022.

Editores convidados:

Henrique Provinzano Amaral (USP)

Vanessa Massoni da Rocha (UFF)