Chamada para o nº 25 — Literatura e artes visuais: entre o lisível e o visível

2019-05-18

Neste número da revista Criação & Crítica, propomos pensar, para além de questões exclusivamente comparatistas, a relação entre literatura e artes visuais. Quais aspectos dessa “ligação absolutamente essencial”, segundo Michel Butor (1963), podemos ainda hoje explorar nas criações artísticas e literárias?

Essa discussão remonta há mais de vinte e quatro séculos na criação literária e artística ocidental. Plutarco (46 – 125) já testemunhava que Simónides de Ceos (556 a.C – 468 a.C), seis séculos antes, chamava a pintura de poesia muda e a poesia de pintura falante. Uma formulação sobre a correspondência da poesia com a pintura que atravessará os séculos sempre ganhando novos contornos no que concerne hoje a relação entre Literatura e Artes Visuais.

Com a radical desterritorialização disciplinar das práticas artísticas e literárias no século XX, foram lançadas no seio dessa antiga discussão uma desafiadora quantidade de novos elementos que estão longe de um consenso na forma de abordá-los. Somada à discussão de um possível  fim da literatura estimulada por novas práticas literárias apresentadas como pós-literatura, neo-literatura, “literatura fora do livro”, “literatura de exposição” ou, ainda, “literatura plástica”, uma outra profusão de novos campos e categorias como interartes, hibridização, cruzamentos, mestiçagem, intersemiótica, transestética, transcriação, mixed media, transmidialidade, pluri-, multi-, intermidialidade, etc., transforma uma simples escolha terminológica numa tarefa nada evidente.

Muito já se escreveu sobre os elementos pictóricos, descritivos e expositivos da Literatura, assim como dos elementos poéticos, retóricos ou narrativos das Artes Visuais. As implicações dessa relação possibilitam reflexões altamente fecundas no contexto francês do século XIX, em que escritores e pintores conviviam em intenso diálogo na prática da literatura e da pintura, nessa época, vistas como “artes irmãs”. O que ainda se pode dizer da pintura ficcional de Balzac com os seus Frenhofer e Probus na Obra-prima ignorada? Ou das pinturas de Claude Lantier no A obra de Zola? Ou ainda as obras de arte imaginadas por Proust Em busca do tempo perdido que  compõem não só a narrativa como apresentam uma ligação direta com a própria estrutura do romance, construído tal qual uma catedral, em clara referência à série de Monet sobre a catedral de Rouen pintada entre 1892 e 1894. O efeito de névoa retratado na pintura e que encobre o edifício, revelando-o aos poucos, foi incorporado na própria obra proustiana.

Se a pictopoética dos caligramas de Apollinaire trata ainda da sincretização do texto-imagem pelo medium da literatura, ou seja, o livro, como pensar o poema-objeto de Breton ou a obra A traição das imagens na qual Magritte infiltra o enunciado “Ceci n’est pas une pipe” em pleno espaço pictórico? Essas questões, já frequentadas por Foucault no seu célebre livro que traz como título as mesmas palavras pintadas no quadro de Magritte, continuam alimentando uma discussão hoje ampliada por inúmeras outras questões em torno da chamada “tentação literária da arte contemporânea”. Citando ainda os livros ilustrados, como os de Odilon Moraes e de Bruno Munari, os livros de artista, tais como os de Júlio Plaza e de Michel Butor, certas obras de Nuno Ramos e de Élida Tessler, dentre tantos outros, poderíamos elencar uma série com os mais díspares exemplos de como cada artista ou escritor encontra a sua própria maneira de potencializar a co-implicação do verbal e do visual, do ler e do ver. Entendendo aqui a prática intelectiva produtora de significação como o que é próprio do ler e a prática perceptiva produtora de sensação como o que é próprio do ver.

Esperamos contribuições que reflitam sobre a questão da escrita literária em diálogo com os seguintes meios: desenho, gravura, pintura, escultura, fotografia, performance, instalação, arte conceitual, livro de artista, ilustração, graffiti e os possíveis desdobramentos artísticos-literários suscitados a partir dessas aproximações. 

As contribuições devem ser enviadas através do site, de acordo com as normas da revista, até 30 de agosto de 2019.

A revista aceita artigos em português, francês, espanhol e inglês.

http://www.revistas.usp.br/criacaoecritica

 

Editor Convidado:

Jérôme Glicenstein (Paris VIII)

Editores:

Aline Magalhães dos Santos Silvério Ishii (USP)

Josias Padilha (USP/Paris VIII)

Amayi Luiza Soares Koyano (USP)