Minuta Técnica sobre Sustentabilidade das Revistas Acadêmicas na área de História

2022-03-29

FÓRUM DE EDITORES DA ANPUH


Minuta Técnica sobre Sustentabilidade das Revistas Acadêmicas na área de História

 

       O processo de manutenção e criação de revistas, em quaisquer áreas, deve envolver, inevitavelmente, a discussão de como elas se manterão. De tal modo, todo projeto editorial deverá abarcar a questão da sustentabilidade. Importante ressaltar que apesar de sempre estar fortemente associada à questão financeira do periódico, a sustentabilidade engloba também a capacidade de captar artigos, assim como ter uma equipe (equipe técnica, editores, pareceristas, entre outros) para conduzir os trabalhos, estratégias de adesão à comunidade de pesquisa, entre outros elementos, como iremos ressaltar.
         Uma primeira consideração a ser feita é relativa aos tipos de custos que englobam a manutenção de um periódico. De modo geral, e tendo como ponto de partida estudos e análises que tratam do tema (JOHNSON; WATKINSON; MABE, 2018), podemos considerar que os custos de manutenção de um periódico são dos seguintes tipos:

(a) Custo de edição do artigo: valores envolvidos diretamente no tratamento do artigo, como revisão textual, padronização, DOI, parte do custo de diagramação, marcação XML, sistema de verificação de similaridade (também chamado de antiplágio), plataforma de gerenciamento do fluxo editorial (as plataformas pagas cobram por submissão);

(b) Custo de infraestrutura: valores envolvidos na manutenção da plataforma de gerenciamento do fluxo editorial, parte do custo de diagramação, custo de filiação às associações (quando isto é requisito para acesso a determinados serviços – como verificação de similaridade, DOI, entre outros), demais custos editoriais que não estão diretamente associados ao artigo e ao pessoal;

(c) Custo de pessoal: equipe que oferece suporte ao processo editorial, no geral envolve secretários, parte administrativa, editores, editores assistentes e quaisquer pessoas que recebam alguma remuneração, em espécie, para se dedicar à publicação (somente deve ser considerado nesta categoria se houver relação remuneratória);

(d) Custos intangíveis: todos os custos que estão associados a trabalho voluntário, podendo inclusive sobrepor as categorias anteriores, quando elas não são remuneradas (engloba, mas não se limita: editores – que conduzem o processo de avaliação dos artigos –, avaliadores, equipes editoriais, revisão textual, diagramadores, entre outros).

        Da forma como foi colocada, os custos estão associados a duas grandes categorias: (a), (b) e (c) são custos pagos em espécie; enquanto (d) é custo indireto, a contrapartida à realização do trabalho não é financeira. Neste sentido e considerando a terminologia utilizada pelo SciELO Brasil no documento ‘Critérios, política e procedimentos para a admissão e a permanência de periódicos na Coleção SciELO Brasil’ (SCIELO BRASIL, 2020) podemos considerar a discussão sobre sustentabilidade a partir dos seguintes termos:

● Sustentabilidade operacional, relacionada a recursos humanos;
● Sustentabilidade financeira.

     Enquanto que os itens de (a) a (d) dizem respeito à questão da sustentabilidade financeira, a sustentabilidade operacional engloba alguns elementos do campo do simbólico, do reconhecimento do periódico enquanto espaço de circulação do saber, como por exemplo, a capacidade do periódico de captar um fluxo de manuscritos que permita, de forma orgânica, manter o periódico e ser compatível com as taxas de publicações da área, assim como mobilizar pareceristas ad hoc para elaborarem, pareceres que servirão de subsídios aos editores na tomada de decisão no processode avaliação.

      Tendo isso em vista, sugerimos que a comunidade leve em consideração os quesitos abaixo como necessários à sustentabilidade de nossos periódicos:

● discutir modos de um reconhecimento institucional (no nível das comunidades de pesquisa e suas associações e no nível das universidades, institutos, núcleos de pesquisa e departamentos) do trabalho das equipes editoriais, incluindo a valorização e reconhecimento das horas de trabalho dedicadas para a produção e edição dos periódicos - devendo considerar, inclusive, uma equivalência do trabalho de editor com outros trabalhos já reconhecidos no âmbito institucional das universidades e centros de pesquisa, por exemplo;

● englobar, no reconhecimento supracitado, estes trabalhos como parte integrante da atuação junto aos programas de pós-graduação, tanto no nível dos docentes quanto de discentes;

● discutir formas de ampliar a valorização do trabalho dos pareceristas ad hoc voluntários que na maioria das vezes realizam um trabalho que sequer é visto;

● discutir igualmente formas de ampliar a valorização de trabalhos acadêmicos que são feitos no âmbito das revistas, como organização de seções, traduções, entrevistas, etc.;

● ampliar as discussões e aproximações, junto a coordenação de avaliação da CAPES e o Fórum de Pós-Graduação, ao considerar os quesitos aqui citados, a dinâmica própria do ecossistema de publicação científica em periódico e as particularidades da área no processo de estabelecimento dos critérios de avaliação que afetam os periódicos;

● defender editais de fomento específicos para a área de Humanidades e que eles contemplem a diversidade dos periódicos no campo, bem como a reivindicação de recursos tanto em nível local (universidades, institutos, departamentos, programas de pós-graduação) quanto em nível regional (junto às fundações de apoio estaduais);

● garantir o suporte institucional, sobretudo das equipes de Tecnologia de Informação, bem como de bibliotecários, para manutenção e aprimoramento das revistas;

● defender como prática constitutiva de nosso campo o modelo de acesso aberto diamante - ou seja, sem cobrança de taxas para acesso e publicação - em que a cobrança de alguns custos de publicação (como revisão e tradução) ou mesmo campanhas de financiamento coletivos devem ser sempre vistas como eventuais.

     No sentido aqui exposto, o processo de criar e manter um periódico científico não diz respeito simplesmente a ter recursos financeiros iniciais ou uma equipe inicial no processo de lançamento de um primeiro número. Envolve também:

● considerar, no momento da discussão da criação de um projeto editorial de periódico, qual lacuna/espaço entre os veículos de comunicação científicos da área será preenchida pelo novo periódico;

● pensar estratégias que visem garantir a criação de um fluxo de recebimento de manuscritos de forma orgânica e consistente;

● considerar a necessidade da preservação digital (como as iniciativas Rede Cariniana, Lockss e Portico), os autores necessitam de uma garantia de que seu artigo publicado continuará disponível no médio e longo prazo, sendo que os portais de periódicos institucionais têm atuado neste sentido;

● construir um espaço institucional de veiculação de conhecimento científico de qualidade junto à comunidade de pesquisa – será esse reconhecimento da área que possibilitará a adesão de pareceristas ad hoc voluntários posteriormente, assim como contribuirá na criação de um fluxo de recebimento de manuscritos de forma orgânica e consistente nos períodos após a publicação do primeiro número;

● manter a periodicidade da publicação significa, para além do atendimento de um requisito formal exigido por indexadores, evidencia uma garantia do compromisso da equipe editorial com os autores, com os leitores e com a comunidade de pesquisa na qual o periódico está inserido;

● fazer circular os textos publicados, tanto no nível da divulgação científica quanto da comunicação científica, é essencial no processo de possibilitar que o artigo chegue aos leitores que possam fazer usos dele.

           Em suma, a criação e manutenção de periódicos, assim como a preocupação num processo consistente que garanta sua sustentabilidade, deve envolver um compromisso dos envolvidos que possa ser aferido, pela instância na qual o periódico estará vinculado, através de um projeto editorial que abarque objetivos de curto e médio prazo no que tange a execução das atividades editoriais e publicações dos primeiros números, assim como políticas de comunicação e divulgação científicas.

 

Aprovado em reunião on-line do Fórum de Editores
da ANPUH em 30 de novembro de 2021.

 

Referências

JOHNSON, Rob; WATKINSON, Anthony; MABE, Michael. The STM Report An overview of scientific and scholarly publishing. STM: International Association of Scientific, Technical and Medical Publishers. 2018. Disponível em: https://www.stmassoc.org/2018_10_04_STM_Report_2018.pdf. Acesso em: 27 nov. 2019.

SCIELO BRASIL. Critérios, política e procedimentos para a admissão e a permanência de periódicos na Coleção SciELO Brasil. SciELO Brasil. 13 maio 2020. Disponível em: https://wp.scielo.org/wp-content/uploads/20200500-Criterios-SciELO-Brasil.pdf. Acesso em: 28 jun. 2020.