Deportabilidade

Um novo paradigma na política migratória brasileira?

Autores

  • Svetlana Ruseishvili Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
  • João Chaves

DOI:

https://doi.org/10.11606/issn.2176-8099.pcso.2020.171526

Palavras-chave:

Deportabilidade, Política migratória, Portaria 666, Migração

Resumo

Neste artigo, procura-se refletir sobre o texto da Portaria no 666, publicada pelo Ministro da Justiça e Segurança Pública no dia 26 de julho de 2019, no contexto da legislação migratória brasileira. Discute-se que o evidente desacordo da Portaria com os princípios que regem a nova Lei de Migração é uma manifestação da contradição contemporânea entre a concepção clássica da soberania como monopólio do Estado sobre o seu território e a erosão dessa última pelas novas práticas de governança global. Argumenta-se também que o texto da Portaria produz a deportabilidade do migrante, compreendida como a possibilidade de removê-lo do território nacional de maneira sumária. A deportabilidade reforça a ilusão de provisoriedade do migrante e provoca a moralização de sua condição pela sociedade do país de instalação. Produzindo efeitos econômicos e políticos concretos na vida dos migrantes, a Portaria anuncia também uma possível mudança de paradigma migratório no Brasil.

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Biografia do Autor

  • Svetlana Ruseishvili, Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)

    Professora do Departamento de Sociologia da Universidade Federal de São Carlos e coordenadora do Grupo Interdisciplinar de Estudos das Migrações e Mobilidade (InterMob).

  • João Chaves

    Defensor Público Federal. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco.

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Publicado

2020-06-27

Edição

Seção

Dossiê: "Migrações internacionais na agenda sociológica contemporânea"

Como Citar

Ruseishvili, S., & Chaves, J. (2020). Deportabilidade: Um novo paradigma na política migratória brasileira?. Plural, 27(1), 15-38. https://doi.org/10.11606/issn.2176-8099.pcso.2020.171526