puspPsicologia USPPsicol. USP0103-65641678-5177Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo10.1590/0103-6564e21015900229ArtigoDepressão em pessoas sob aprisionamento no sistema carcerário: revisão integrativaDepression among the incarcerated population: an integrative reviewLa dépression chez les personnes incarcérées dans le système pénitentiaire : une revue intégrativeDepresión en personas aprisionadas en el sistema penitenciario: revisión integrativa0000-0003-2922-713XBahianoMilena de Andrade1*0000-0002-7348-6297FaroAndré1Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE, BrasilUniversidade Federal de SergipeSão CristóvãoSEBrasil
Endereço para correspondência: millahandrade@hotmail.com14092022202233e210159151220211403202220042022Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative CommonsResumo
Esta revisão integrativa objetivou reunir estudos sobre a depressão em pessoas sob aprisionamento no sistema carcerário. As bases de dados pesquisadas foram PePSIC, PsycINFO, SciELO e Web of Science. As ferramentas de suporte para a extração dos artigos selecionados foram o programa computacional StArt e as recomendações Prisma. Os termos usados na busca eletrônica foram “inmate”, “prison”, “prisoner”, “penitentiary” e “depression”. A amostra final foi composta por 10 estudos primários, os quais atenderam aos critérios de inclusão e à questão norteadora da revisão. Dentre os achados, a ocorrência de depressão foi evidente em todos os artigos selecionados, e o Inventário de Depressão de Beck foi o instrumento mais utilizado. Por fim, percebeu-se que a identificação precoce de sintomatologia depressiva pode minimizar prejuízos físicos e mentais na população em encarceramento.
Abstract
This integrative review analyzed studies about depression among people imprisoned in the prison system. Bibliographic search was conducted on the PePSIC, PsycINFO, SciELO and Web of Science databases. Papers were selected following the PRISMA recommendations, and then extracted using the StArt software. The search strategy used the terms “inmate,” “prison,” “prisoner,” “penitentiary” and “depression,” The final sample included 10 primary studies that met the inclusion criteria and answered the research question. All selected articles indicated the occurrence of depression, assessed by the Beck Depression Inventory. Finally, early identification of depressive symptoms can minimize physical and mental harm in the incarcerated population.
Résumé
Cette revue intégrative a analysé les études sur la dépression chez les personnes incarcérées dans le système pénitentiaire. Une recherche bibliographique a été menée sur les bases de données PePSIC, PsycINFO, SciELO et Web of Science. Les articles ont été sélectionnés en suivant les recommendations PRISMA, puis extraits à l’aide du logiciel StArt. La stratégie de recherche utilisait les termes “détenu”, “prison”, “prisonnier”, “pénitencier” et “dépression”. L’échantillon final comprenait 10 études primaires répondant aux critères d’inclusion et à la question de recherche. Tous les articles sélectionnés indiquaient la survenue d’une dépression, évaluée par l’inventaire de dépression de Beck. Enfin, l’identification précoce des symptômes dépressifs peut minimiser les dommages physiques et mentaux au sein de la population carcérale.
Resumen
Esta revisión integradora tuvo como objetivo reunir estudios sobre la depresión en personas encarceladas en el sistema penitenciario. Las bases de datos buscadas fueron PePSIC, PsycINFO, SciELO y Web of Science. Se utilizaron el programa informático StArt como herramienta de apoyo para la extracción de los artículos seleccionados y las recomendaciones PRISMA. Los términos utilizados en la búsqueda electrónica fueron: “inmate”, “prison”, “prisoner”, “penitentiary” y “depression”. La muestra final estaba compuesta por 10 estudios primarios, que cumplían los criterios de inclusión y la pregunta guía de la revisión. Entre los hallazgos, la depresión fue evidente en todos los artículos seleccionados y el Inventario de Depresión de Beck fue el instrumento más utilizado. Finalmente, se percibió que la identificación temprana de la sintomatología depresiva puede minimizar los daños físicos y mentales en la población encarcelada.
Palavras-chave:sistema penitenciáriopresidiáriosprisãodepressãopsicologia da saúdeKeywords:prison systemprison inmateprisondepressionhealth psychologyMots-clés :système pénitentiaireprisonnierprisondépressionpsychologie de la santéPalabras clave:sistema penitenciarioprisionerosprisióndepresiónpsicología de la salud
Em janeiro de 2017, o sistema prisional brasileiro retorna ao cenário nacional e internacional com mais uma crise deflagrada em seu interior. As rebeliões que ocorreram no país devido às superlotações nas prisões, guerras de facções, violação de direitos humanos, condições precárias de saúde e morosidade da justiça trouxeram à tona a debilidade da situação carcerária do país e, em paralelo, as reais condições de vida dentro das prisões.
O banco de dados World Prison Brief (WPB) (http://www.prisonstudies.org/) estima a população carcerária mundial em mais de 11 milhões de indivíduos. O Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), até meados de 2016, contabilizou uma população prisional de 726.712 pessoas em privação de liberdade. Sob custódia do Estado, encontram-se 689.510 encarcerados (Santos, 2017). Nesse cenário, o Brasil ocupa o terceiro lugar entre as maiores populações carcerárias do mundo, atrás dos Estados Unidos (2.217.000) e da China (1.657.812) (Ministério da Justiça, 2014).
A perda do autogerenciamento de vida e as indefinições quanto ao futuro aumentam o risco de desenvolvimento de sintomas e transtornos depressivos nas pessoas privadas de liberdade (Colombaroli, 2013; Pinheiro & Cardoso, 2011). Elementos estressores como o ócio, a solidão, a expectativa de condenação ou liberdade, o isolamento social, a violência e agressões frequentes propiciam ao encarcerado uma vivência contínua de emoções negativas como medo, raiva, ansiedade, melancolia, tristeza e solidão (Araújo, Nakano, & Gouveia, 2009; Colombaroli, 2013; Constantino, Assis, & Pinto, 2016; Pinheiro & Cardoso, 2011).
O Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário (PNSSP) destaca que a população prisional no Brasil é amplamente composta por pessoas em situação de vulnerabilidade social, com baixa escolaridade, condenadas pelos crimes de furto e roubo. Grande parte desses indivíduos são reincidentes na prática criminal, bem como retornam aos presídios e penitenciárias com problemas jurídicos e/ou de saúde maiores que à época de sua soltura (Colombaroli, 2013; Ministério da Saúde, 2005). No que diz respeito à população penitenciária, há estimativas de que 10 a 15% apresentam transtornos mentais persistentes; valores superiores aos 2% manifestados na população em geral (Constantino et al., 2016). Nos países ocidentais, estima-se que um a cada sete presidiários seja diagnosticado com transtornos psicóticos, como esquizofrenia, ou depressão maior (Fazel & Danesh, 2002). Com efeito, o desenvolvimento de perturbações mentais na prisão tem contribuído para a reincidência criminal e aumento da massa encarcerada (Colombaroli, 2013).
A depressão é caracterizada por alterações no humor, pensamento e atividade que causam comprometimentos na vida pessoal e social do indivíduo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta a depressão como um transtorno mental que atinge mais de 300 milhões de pessoas no mundo, isto é, cerca de 4,4% da população mundial. No Brasil, a estimativa é que 5,8% da população apresente desordens de natureza depressiva (World Health Organization [WHO], 2017). A depressão é um problema de saúde pública (WHO, 2017), e seus agravos físicos e psicológicos na prisão são aumentados devido ao ambiente estressor, que impõe uma convivência forçosa e restritiva aos apenados (Afonso, 2012; Colombaroli, 2013).
Os sintomas comportamentais, emocionais, cognitivos e físicos da depressão podem incluir afastamento social, fadiga, irritabilidade, choro, distúrbios do sono e alimentação, tentativas de autoagressão e suicídio, concentração e atenção reduzidas, bem como sentimento de culpa e inutilidade variando em intensidade e grau (National Collaborating Centre for Mental Health [NCCMH], 2011; New Zealand, 2008). Estudos evidenciaram que cerca de 20 a 50% dos usuários da atenção básica em saúde possuem algum tipo de desordem mental, e apenas 25% recebem diagnóstico e tratamento adequados (Furtado, 2016). O não reconhecimento e compreensão dos profissionais de saúde quanto às queixas relatadas, que nem sempre se enquadram perfeitamente nas categorias dos manuais diagnósticos psiquiátricos, tem comprometido os cuidados oferecidos em saúde mental nos dispositivos de atenção primária (Fonseca, Guimarães, & Vasconcelos, 2008; Nunes et al., 2016).
Os agravos à saúde mental concernentes à experiência de privação de liberdade são inúmeros e têm chamado a atenção de pesquisadores (Afonso, 2012; Araújo et al., 2009; Constantino et al., 2016), assim como de psicólogos da saúde. A psicologia da saúde prevê que a saúde e a doença são influenciadas por fatores psicológicos, os quais, diante de eventos estressores severos, crônicos e prolongados, podem comprometer o funcionamento imunológico do indivíduo, aumentando as chances de adoecimento físico e mental (Faro & Pereira, 2013; Straub, 2014). Em decorrência da intensidade e tempo de exposição, o estresse pode se cronificar e ocasionar interferências significativas na capacidade de adaptação do indivíduo à situação indutora de estresse (Faro & Pereira, 2013). Nesse sentido, a psicologia da saúde visa contribuir com o campo da prevenção, com a promoção à saúde (Remor, 1999) e com a minoração dos agravos psicológicos decorrentes do aprisionamento.
Em vista disso, este estudo objetivou compreender e integrar o conhecimento evidenciado na literatura científica sobre a depressão, bem como os fatores associados à sua ocorrência em pessoas encarceradas no sistema penitenciário. Para tanto, estabeleceu-se como perguntas norteadoras desta revisão da literatura: Quais são as informações disponíveis na literatura científica sobre a ocorrência e características clínicas da depressão em pessoas sob privação de liberdade no sistema carcerário? Quais são os fatores sociodemográficos e institucionais mais frequentemente associados à ocorrência da depressão em pessoas encarceradas no sistema prisional?
Método
Este estudo se trata de uma revisão integrativa que consiste em uma abordagem metodológica, a qual sistematiza, sintetiza e analisa os dados de estudos primários contidos em pesquisas experimentais e não experimentais. O objetivo é agregar evidências sobre o fenômeno ou tema investigado, além de auxiliar a prática e o processo de tomada de decisões em saúde (Botelho, Almeida Cunha, & Macedo, 2011; Whittemore & Kanfl, 2005).
A elaboração dessa revisão foi composta pelas seguintes etapas: (1) identificação do tema e formulação da questão norteadora; (2) definição dos critérios de inclusão e exclusão; (3) identificação dos estudos selecionados; (4) elaboração de categorias para análise das informações; (5) discussão dos resultados; e (6) síntese dos resultados encontrados (Botelho et al., 2011). Como ferramenta de suporte para a seleção dos artigos foi utilizado o software State of the Art through Systematic Review (StArt) (http://lapes.dc.ufscar.br/tools/start_tool), além das recomendações Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (Prisma) para seleção dos estudos primários a serem incluídos na revisão (Galvão, Pansani, & Harrad, 2015; Munzlinger, Narcizo, & Queiroz, 2012).
Foram selecionados os artigos indexados nas bases de dados online PePSIC, PsycINFO, SciELO e Web of Science. Optou-se por não delimitar um intervalo de tempo no modo de busca dos artigos publicados, tendo em vista a não exclusão de pesquisas relevantes sobre o estudo da depressão e fatores associados à sua ocorrência em presidiários. Todos os artigos indexados até abril de 2018, publicados em português, inglês e espanhol e disponibilizados na íntegra ou em acesso livre foram incluídos. Foram excluídos os estudos com menores infratores, agentes prisionais ou outros participantes inseridos no âmbito prisional. Os artigos duplicados, de natureza qualitativa, teóricos e de revisões sistemáticas também foram excluídos, tal como os trabalhos que não apresentaram relação com a pergunta norteadora da revisão.
Visto que o uso da terminologia para nomear o presidiário na literatura é amplo e diversificado, a estratégia de busca contou com o uso do Thesaurus of Psychological Index Terms da American Psychological Association (APA) que contém os termos “inmate” e “penitentiary”. Para isso, utilizou-se também os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), com os termos indexados “prison”, “prisoner” e “depression”. Todos os cruzamentos foram realizados a partir do operador booleano AND. Dessa maneira, a combinação dos descritores e estratégias de buscas nas bases de dados selecionadas procedeu-se de modo diverso e encontra-se descrita na Tabela 1.
Bases de dados, descritores e estratégias de buscas utilizadas na investigação da ocorrência de depressão e fatores associados na população penitenciária brasileira (2018)
Base de dados
Descritores
Estratégias de busca
N
PePSIC
inmate, prison, penitentiary AND depression
todos os índices
08
SciELO
inmate, prison, penitentiary AND depression
todos os índices
35
PsycINFO
prison AND depressioninmate, prisoner penitentiary AND depression
A seleção e a análise dos artigos encontrados foram decompostas em três etapas. Inicialmente os trabalhos foram avaliados pela leitura dos títulos e posteriormente pela leitura dos resumos. Dessa maneira, os artigos duplicados e concordantes com os critérios de exclusão foram dispensados da revisão. Após este primeiro processo de análise, os trabalhos selecionados foram lidos na íntegra e novo processo de exclusão foi efetuado; dessa vez, as pesquisas que não possuíam como participantes pessoas custodiadas em presídios e penitenciárias e cujo estudo não contemplava a questão norteadora foram eliminadas.
Após o levantamento dos artigos resultantes, realizou-se o fichamento dos estudos com as seguintes informações: título, autor, ano e país de publicação, delineamento da pesquisa e quantitativo da amostra, instrumentos utilizados na investigação da depressão e principais resultados encontrados. Desse modo, para a elaboração dos resultados, os dados foram divididos em duas categorias: análise bibliométrica e de conteúdo. Na primeira, constaram-se o ano e o país de publicação, ferramentas utilizadas na investigação da depressão e sexo dos participantes. Na análise de conteúdo foram investigados quatro aspectos: (1) ocorrência de sintomas; (2) fatores sociodemográficos mais associados à depressão; (3) fatores institucionais e apoio social recebido; e (4) características clínicas associadas à depressão. Cabe dizer que nos fatores institucionais serão analisados a associação da depressão com a reincidência criminal, o recebimento de visitas no período de encarceramento e a relação da depressão com o exercício de atividades laborativas na prisão.
As buscas nas bases de dados resultaram em 142 artigos inicialmente selecionados, conforme a Tabela 1. As bases de dados que obtiveram maior número de estudos primários foram a Web of Science (38,7%; n=55), seguida da PsycINFO (31%; n=44), SciELO (24,7%; n=35) e, com número menor de publicações, a PePSIC (5,6%; n=08). Após o descarte dos artigos duplicados (36%; n=51), procedeu-se a etapa de leitura dos títulos e resumos com observância aos critérios de exclusão instituídos (Figura 1).
Processo de seleção e análise dos estudos primários encontrados para a revisão integrativa segundo a recomendação Prisma
Fonte: elaborada pelos autores.
Nessa etapa, foram desconsiderados os estudos primários (42%; n=60) que apresentaram como participantes egressos e agentes do sistema penitenciário, menores infratores, ex-presos políticos, prisioneiros de guerra, sobreviventes de tortura, além de pesquisas com filhos de presidiários e médico-farmacológicas. Os estudos qualitativos, revisão sistemática e artigos não disponibilizados na íntegra também foram excluídos. A maior parte das exclusões decorreram devido à discordância do estudo pré-selecionado com a questão norteadora da revisão. Posteriormente, as publicações selecionadas (n=31) foram lidas na íntegra e, após análise criteriosa, 10 estudos primários (32%) compuseram a amostra final desta revisão.
Resultados
Na Tabela 2 constam os principais achados no que se refere às categorias de análise bibliométrica e de conteúdo.
Principais resultados da análise bibliométrica e de conteúdo sobre a ocorrência, características clínicas e fatores associados à depressão na população encarcerada no sistema prisional brasileiro (2018)
Bibliométrica
Conteúdo
Autoria (ano, país)
Instrumentos e indivíduos (n., sexo)
Objetivo
Ocorrência da depressão
Fatores sociodemográficos
Fatores institucionais
Características clínicas
1. Shrestha et al. (2017, Nepal).
Center for Epidemiologic Studies Depression (CES-D) (434, ♂)
Estimar a prevalência e os fatores associados à depressão.
35,3 % dos internos com sintomas depressivos.
Idade, estado civil, e religião não se associaram à sintomatologia depressiva.
Apoio institucional e reincidência associados à depressão.
Sintomas físicos e ideação suicida mais comuns.
2. Beyen et al. (2017, Etiópia).
Patient Health Questionare-9 (PHQ-9) (649, ♂♀)
Avaliar a prevalência da depressão entre detentos.
43,8% da amostra apresentou sinais de depressão.
Não houve associação com a depressão.
A falta de apoio social se associou à depressão.
Ideação suicida se associou à depressão.
3.Constatino et al. (2016, Brasil).
Inventário de Depressão de Beck (BDI) (1573, ♂♀)
Avaliar a prevalência de depressão e estresse na população encarcerada.
♂ 24,8% sintomas moderados e 6,3% severo. ♀ 39,6% moderados e 7,5% severos.
Associação da depressão com as variáveis idade, estado civil e religião em ambos os sexos.
Apoio social reduzido e atividade laborativa na prisão se associaram à depressão.
Estresse no encarceramento apresentou relação com a depressão.
4. Vélez-Álvarez et al. (2016, Colômbia).
Zung self-rating depression scale (303, ♂)
Avaliar a presença ou ausência de sintomas depressivos na população encarcerada.
27,4% com sintomatologia leve, 8,6% moderada e 2,6% severa.
Houve associação da faixa etária com sintomas depressivos.
Não houve associação da depressão a fatores institucionais.
Desânimo, alterações no sono e ansiedade foram associados à depressão.
5. Osasona & Koleoso (2015, Nigéria).
Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) (252, ♂♀)
Determinar a prevalência de depressão e ansiedade entre presidiários.
72,6% da amostra foi identificada com sintomas depressivos.
Associação da depressão com as variáveis idade e estado civil.
Apoio institucional foi associado à depressão.
Sintomas físicos foram associados à depressão.
6. Uribe-Rodríguez et al. (2012, Colômbia).
Inventário de Depressão Estado-Rasgo (Ider) (112, ♂)
Identificar a prevalência de depressão e ansiedade entre a população aprisionada.
16,07% da amostra com sintomas de depressão na prisão.
Idade e estado civil se associaram à sintomatologia depressiva.
Não foi especificada a relação da depressão com fatores institucionais.
Não houve associação da depressão com suas características clínicas.
7. Canazaro & Argimon (2010, Brasil).
Inventário de Depressão de Beck (BDI-II) (287, ♀)
Investigar a prevalência de sintomas depressivos e de desesperança.
48,7% da amostra com prevalência de depressão.
Ter filhos indicou prevalência maior de sintomatologia depressiva.
A atividade laborativa na prisão se associou a sintomas depressivos.
Ideação suicida foi associada à depressão.
8. Pinese et al. (2010, Brasil).
Beck Depression Inventory (BDI) (100, ♀)
Identificar o perfil de mulheres encarceradas e estimar a depressão.
82 ♀ com sinais de depressão e 20 ♀ com quadro grave.
Idade, estado civil e religião se associaram com sintomas depressivos.
Apoio social associado à sintomatologia depressiva.
Alterações no apetite associados à depressão.
9. Mojica et al. (2009, Colômbia).
Beck Depression Inventory (BDI) (95, ♂).
Avaliar a relação entre risco de suicídio, depressão e desesperança.
41,2% com sintomatologia leve, 27,8% moderada e 11,3% grave.
Não houve associação da depressão com variáveis sociodemográficas.
A reincidência foi associada à depressão.
A depressão foi correlacionada com a desesperança.
10. Boothby & Durham (1999, EUA).
Beck Depression Inventory (BDI) (1494, ♂♀).
Investigar a prevalência de depressão na admissão da prisão.
57% com sintomas de moderado a grave.
Houve associação da depressão com a variável idade.
Relação da reincidência criminal com a depressão.
Não houve associações com a depressão.
Nota. homens (♂) e mulheres (♀) participantes da pesquisa.
Fonte: elaborada pelos autores.
Análise bibliométrica
O maior número de publicações foi em 2010 (20%; n=2), 2016 (20%; n=2) e 2017 (20%; n=2). Os anos de 1999, 2009, 2012 e 2015 seguiram com uma publicação por ano (10% cada). O Brasil (30%; n=3) e a Colômbia (30%; n=3) foram os países que mais tiveram publicações sobre o tema investigado. Os Estados Unidos (n=1), Etiópia (n=1), Nigéria (n=1) e Nepal (n=1) publicaram uma única vez, compondo 40% dos estudos primários incluídos. Quanto aos participantes que constituíram a amostra dos estudos selecionados, 50% foram do sexo masculino, 20% do sexo feminino e 30% compostos por homens e mulheres em condição de encarceramento no sistema penitenciário. Todos os estudos selecionados (n=10) para esta revisão utilizaram abordagem quantitativa.
O Beck Depression Inventory (BDI) foi o instrumento mais utilizado para a mensuração da depressão na população encarcerada, (50%; n=5), apresentando um alfa de Cronbach que variou de 0,81 (Boothby & Durham, 1999; Pinese, Furegato, & Santos, 2010) a 0,72 (Mojica, Sáenz, & Rey-Anacona, 2009). Um dos estudos não fez referência aos dados de consistência interna do BDI, pois descreveu apenas os itens que compõem a escala (Constantino et al., 2016). Outro artigo utilizou a segunda versão do Beck Depression Inventory (BDI-II) como parte de uma pesquisa para validação dessa escala na população prisional (Canazaro & Argimon, 2010). A Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HADS) (Osasona & Koleoso, 2015) e a Zung Self-Rating Depression Scale (Campo, Díaz, & Rueda, 2006; Vélez-Álvarez, Barrera-Valencia, Benito-Devia, Figueroa-Barrera, & Franco-Idarraga, 2016) foram descritas como válidas e amplamente utilizadas em seus respectivos países, isto é, Nigéria e Colômbia. O Center for Epidemiologic Studies Depression (CES-D), Patient Health Questionare-9 (PHQ-9) e o Inventário de Depressão Estado-Rasgo (IDER) foram apontados como ferramentas de boa qualidade psicométrica com verificação positiva da consistência interna pelo alfa de Cronbach (0,91, 0,84 e 0,87 respectivamente) (Constantino et al., 2016; Shrestha et al., 2017; Beyen, Dadi, Dachew, Muluneh, & Bisetegn, 2017).
Análise do conteúdoOcorrência da depressão
Todos os artigos selecionados (n=10) relataram em seus estudos a ocorrência de sintomas depressivos em suas amostras. No Rio Grande do Sul, uma penitenciária identificou um alto índice de sintomas depressivos (48,7%) entre as mulheres presas (Canazaro & Argimon, 2010). Em outro estudo realizado com 100 mulheres no estado de São Paulo, também foi observada a ocorrência de sintomatologia depressiva em 82 apenadas, e 20 desses casos foram considerados de natureza grave (Pinese et al., 2010). No Rio de Janeiro, a pesquisa apontou que 39,6% das mulheres encarceradas apresentaram sintomas depressivos moderados, e um percentual de 7,5%, sintomas graves. Na população masculina a incidência foi de 24,8% para sintomas moderados e 6,3% para sintomas graves de depressão (Constantino et al., 2016).
Como mencionado anteriormente, três pesquisas foram realizadas na Colômbia. Na primeira, verificou-se a ocorrência de depressão nos presidiários em níveis mais altos do que a identificada na população em geral: 41,2% com sintomatologia leve, 27,8%, moderada e 11,3%, grave (Mojica et al., 2009). A segunda, feita com 112 homens em um presídio colombiano, indicou um percentual de 16,07% com sintomas depressivos no momento do estudo. Em contrapartida, 43,68% foram identificados com sintomas de depressão sugerindo adoecimento mental anterior à condição de encarceramento atual (Uribe-Rodriguez, Martínez-Rodriguez, & López-Romero, 2012). A terceira, conduzida a partir de uma amostra de 303 homens, constatou a prevalência de 2,6% dos internos com sintomatologia depressiva em nível severo, 8,6%, moderado e 27,4%, leve (Vélez-Álvarez et al., 2016).
Em uma prisão da Etiópia, detectou-se uma prevalência de 43,8% de internos com sinais de depressão, configurando um alto índice na população investigada (Beyen et al., 2017). A ocorrência de sintomas depressivos entre 434 participantes de uma pesquisa no Nepal alcançou um percentual de 35,3% (Shrestha et al., 2017). Já em uma prisão da Nigéria, constatou-se que 72,6% dos participantes da amostra foram identificados com depressão (Osasona & Koleoso, 2015). Nos EUA, um estudo realizado com 1494 pessoas em condição de privação de liberdade mostrou que 57% se enquadravam nos critérios de depressão moderada a grave (Boothby & Durham, 1999).
Fatores sociodemográficos
As variáveis sociodemográficas que exibiram associação com a sintomatologia depressiva nos estudos selecionados foram: idade, estado civil, filhos e religião. Seis estudos relacionaram a idade com a depressão (60%; n=6). Com base nessas investigações, observou-se a associação estatisticamente significativa de sintomas depressivos nas faixas etárias de 18 a 68 anos de idade (Constantino et al., 2016; Osasona & Koleoso, 2015; Uribe-Rodriguez et al., 2012). Entre 18 e 44 anos a prevalência foi de 38,7% dos casos de depressão em uma prisão (Vélez-Álvarez et al., 2016). Em mulheres abaixo dos 29 anos, a prevalência foi de 19,1% de depressão severa e 20,8% acima dos 30 anos (Pinese et al., 2010). Uma pesquisa identificou que os internos abaixo dos 20 anos apresentaram taxas mais altas de sintomatologia depressiva quando comparados com internos de outras faixas etárias (Boothby & Durham, 1999).
Quatro estudos apontaram relação entre depressão e estado civil. Os participantes identificados como solteiros foram classificados como mais deprimidos do que os participantes que relataram estar casados ou possuir um(a) companheiro(a) (Beyen et al., 2017; Pinese et al., 2010). A associação das variáveis estado civil e depressão ainda encontrou relação estatisticamente significativa em dois estudos (Constantino et al., 2016; Osasona & Koleoso, 2015).
Verificou-se em dois trabalhos que as mulheres presas que possuíam filhos apresentavam maior frequência de sintomas depressivos em relação às mulheres que não eram mães (Canazaro & Argimon, 2010; Pinese et al., 2010). Praticar ou não alguma religião denotou associação com a depressão em dois artigos: os homens que eram praticantes eventuais aumentaram em 2,34 vezes as chances de desenvolverem sintomas depressivos na prisão, se comparados aos internos que tiveram a religião como prática frequente (Constantino et al., 2016). Já as mulheres não praticantes aumentaram em 6,09 vezes a probabilidade de desenvolverem sintomas depressivos moderados durante o aprisionamento (Pinese et al., 2010).
Fatores institucionais e apoio social no aprisionamento
Os fatores institucionais mais comumente associados à depressão se referiram à reincidência criminal, demanda por busca de serviços de saúde, visitas e atividades laborativas realizadas na prisão. O apoio social recebido por meio do vínculo familiar também se relacionou com a depressão no período do encarceramento.
Três estudos revelaram que reclusos reincidentes apresentaram maior propensão ao acometimento por sintomas depressivos na prisão do que os não reincidentes (Boothby & Durham, 1999; Mojica et al., 2009; Shrestha et al., 2017). Dois artigos relacionaram a demanda por serviços de saúde com sintomas depressivos. As pessoas presas que com frequência solicitaram serviços e consultas da equipe de saúde exibiram mais frequentemente sintomatologia depressiva (p=0,028) e chances de estarem deprimidas (p>0,001) (Osasona & Koleoso, 2015; Shrestha et al., 2017). Exercer atividades laborativas na prisão mostrou associação significativa com a depressão em dois estudos. O trabalho efetuado dentro da unidade prisional favoreceu o decréscimo de sintomas depressivos (p=0,021 e p=0,02), e foi considerado um fator protetor da saúde mental (Canazaro & Argimon, 2010; Constantino et al., 2016).
Em outro estudo observou-se que as mulheres que recebiam visitas durante o aprisionamento apresentaram menor percentual de depressão severa (12,2%) quando comparadas às que não recebiam visitas (27,4%) (Pinese et al., 2010). Ademais, dois artigos associaram o apoio social recebido com a depressão. Os estudos relataram que um bom vínculo familiar reduziu a probabilidade de os apenados desenvolverem sintomas depressivos na prisão. Os indivíduos que relatavam possuir algum apoio social diminuíam em 62% as chances de apresentarem sintomatologias depressivas (Beyen et al., 2017); já as mulheres sem apoio familiar aumentaram em 2,49 vezes a probabilidade de desenvolverem depressão no cárcere (Constantino et al., 2016).
Características clínicas associadas à depressão
Em relação às características clínicas, quatro artigos associaram a depressão com a presença de ideações suicidas e risco efetivo de suicídio na prisão. Verificou-se que a ideação e o risco de suicídio tornam mais prováveis o desenvolvimento de sintomas e transtornos depressivos durante o encarceramento (Beyen et al., 2017; Canazaro & Argimon, 2010; Mojica et al., 2009). Em um estudo, a ocorrência de depressão foi mais prevalente nos reclusos com ideação suicida (70%) do que nos indivíduos que não possuíam tais ideações (34,4%) (Shrestha et al., 2017).
O estresse ocasionado pela situação e condições de confinamento foi um fator preditor para o acometimento de sintomas de depressão em homens (p<0,001) e mulheres (p<0,001) (Constantino et al., 2016). A ansiedade se relacionou com a depressão em dois estudos: uma pesquisa encontrou um percentual de 61,1% de sintomas de ansiedade em internos identificados com depressão em uma prisão (Uribe-Rodriguez et al., 2012), e outro trabalho referiu um percentual de 47,2% de sintomas ansiosos em uma amostra com quadro depressivo (Vélez-Álvarez et al., 2016).
Um dos artigos abordou a relação entre a autoavaliação da pessoa presa sobre o seu estado de saúde e a depressão. A prevalência da depressão foi maior nas pessoas que autoavaliaram a saúde como ruim (40,4%) do que nos indivíduos que a qualificaram como boa (27,9%) (Shrestha et al., 2017). Outro estudo constatou que 44,5% da amostra com quadro depressivo relatou o desânimo como um dos sintomas negativos percebidos (Vélez-Álvarez et al., 2016).
Os transtornos dos hábitos alimentares e perda de peso também foram associados ao acometimento de sintomas e quadros depressivos na prisão. Verificou-se níveis altos de depressão severa (35,9%) e moderada (30,2%) entre as mulheres identificadas com transtornos alimentares no decurso do aprisionamento (Pinese et al., 2010). A perda de peso, ao longo do encarceramento, obteve correlação significativa com o acometimento de sintomatologias depressivas na prisão. Nesse estudo 39,3% dos indivíduos que relataram emagrecimento se encontravam deprimidos (Shrestha et al., 2017).
Discussão
De acordo com a literatura, a população prisional encontra-se em contínuo crescimento, e a maior parte da massa encarcerada está localizada em países de baixa e média renda (Beyen et al., 2017). Com efeito, observou-se nos estudos primários selecionados que, com exceção dos EUA, todos os países que compuseram este estudo são países em desenvolvimento e que apresentam em seus sistemas prisionais uma assistência e rede de atenção à saúde deficitárias, bem como baixas condições de infraestrutura em suas prisões. Nesse cenário, a insuficiência de cuidados e atenção à saúde mental podem acarretar ao preso complicações em seu processo de reclusão e se estender a sua vida em liberdade (Afonso, 2012; Araújo et al., 2009; Constantino et al., 2016; Pinheiro & Cardoso, 2011). Todavia, nota-se que os serviços de atenção à saúde mental ofertados à população carcerária ainda não são proporcionais às necessidades das pessoas presas, denotando carência de cuidados e atenção psicológica durante o encarceramento (Bowler, Phillips, & Rees, 2018). Comumente, as perturbações mentais são subdiagnosticadas e tratadas nos serviços de saúde, e, com isso, a tendência é que as taxas de prevalência dessas desordens na população encarcerada se elevem (Fazel, Hayes, Bartellas, Clerici, & Trestman, 2016). Em decorrência do subdiagnóstico, muitas pessoas já adentram as prisões com desordens mentais não diagnosticadas e que só tendem a se agravar diante da situação de privação de liberdade (Beyen et al., 2017).
Em relação à composição das amostras dos estudos selecionados, a maioria dos participantes investigados foi do sexo masculino. Tal resultado também foi constatado em outro estudo, o qual apontou que a população prisional masculina, além de ser a mais prevalente nas prisões, também tem sido a mais investigada empiricamente (Gois, Santos Jr., Silveira, & Gaudêncio, 2012). Cabe pontuar que, mesmo que o cárcere imponha condições semelhantes de encarceramento, é sabido que cada indivíduo apresentará processos de ajustamento e de adaptação singulares à sua experiência de perda da liberdade (Afonso, 2012; Gonçalves & Gonçalves, 2012). A literatura indica que as necessidades e características psicológicas de jovens, homens, mulheres e idosos na prisão são distintas e, por isso, demandam atenção diferenciada no sistema prisional (Fazel et al., 2016; Gois et al., 2012). Nesta revisão, por exemplo, sintomas e transtornos depressivos exibiram associação significativa com a variável idade. Segundo a recomendação do Conselho da Europa, o tratamento em saúde direcionado à população prisional deve se ater às singularidades do processo de aprisionamento de jovens, adultos e idosos, bem como dar atenção às questões psicológicas e físicas atribuídas a cada fase de desenvolvimento da vida (Madzharov, 2016). Ademais, as normas internacionais, as quais definem os cuidados e atenção à saúde prisional, preveem que as pessoas presas devam sair das unidades prisionais em condições de saúde melhores do que na ocasião da sua custódia (Constantino, et al., 2016; Gois et al., 2012).
Quanto à depressão, os estudos aqui avaliados indicaram elevada ocorrência do transtorno na população investigada. Tal constatação se encontra em conformidade com achados de outra investigação, a qual verificou que o índice de depressão e transtornos mentais na população prisional é comumente maior do que o identificado na população em geral (Constantino et al., 2016; Fazel & Danesh, 2002). Fazel et al. (2016) alertaram que as taxas de prevalência de perturbações mentais nas prisões precisam ser analisadas com cautela, já que os instrumentos de rastreamento são passíveis de apresentarem taxas mais altas de falsos positivos e os instrumentos de diagnóstico - usualmente não validados na população prisional - podem mascarar os dados estimados nos resultados em termos de aumento ou até subestimação dos índices.
Conforme pontuou Fazel et al. (2016), a entrevista diagnóstica Mini International Neuropsychiatric Interview (Mini), por exemplo, quando aplicada no contexto penitenciário, tende a aumentar a incidência de transtorno obsessivo compulsivo e de mania. Além destas desordens identificadas, o estudo indicou que os transtornos de personalidade e o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade também foram propensos a apresentarem resultados superestimados nas prisões. No entanto, os autores ressaltaram que a prevalência de transtorno depressivo no cárcere tem se mostrado consistente em vários estudos analisados.
Vale destacar que os instrumentos utilizados nos estudos aqui analisados foram em sua totalidade identificados como instrumentos de rastreio, ou seja, produzem uma estimativa inicial da ocorrência da depressão. Segundo o Ministério da Saúde, os instrumentos de rastreamento devem ser incluídos nas estratégias básicas de prevenção à saúde, visando à busca por sinais e sintomas iniciais de um quadro de adoecimento, o que auxilia o profissional de saúde no diagnóstico da doença (Ministério da Saúde, 2010).
No caso da população prisional, o uso do instrumento de rastreio se constitui como uma ferramenta importante, uma vez que otimiza o processo de identificação e tratamento precoce da depressão durante o aprisionamento, especialmente dado o fato de que a depressão é fator de risco para o suicídio e outros agravos na prisão (Fazel & Danesh, 2002). Tal constatação também se relacionou com os achados desta pesquisa, os quais evidenciaram a relação entre sintomatologias e transtornos depressivos com presença de ideação suicida e risco efetivo de suicídio durante o encarceramento. Segundo Fazel et al. (2016), a morte por suicídio e a automutilação são bastante comuns entre a população encarcerada, mas esses dados não são devidamente registrados. Isso compromete as estatísticas encontradas sobre esses agravos, que geralmente são associados a acidentes e/ou mortes por causas desconhecidas ou naturais no decorrer do encarceramento.
Em suma, entende-se que a identificação precoce das sintomatologias e transtornos depressivos nos apenados é importante para o profissional de saúde que lida diretamente, ou não, com pessoas privadas de liberdade. Dessa maneira, os comprometimentos à saúde física e mental do recluso durante o aprisionamento tendem a ser minimizados, e a evolução do quadro clínico depressivo, prevenida precocemente.
Considerações finais
A partir dos estudos selecionados, objetivou-se integrar o conhecimento produzido acerca da ocorrência e fatores associados à depressão em pessoas presas no sistema penitenciário, a fim de que a prática de psicólogos e demais profissionais da área da saúde inseridos no sistema prisional possa ser orientada com base em evidências científicas e com vistas à prevenção e à promoção da saúde. Ademais, a identificação e tratamento precoce de sintomas e transtornos depressivos contribui na minoração de prejuízos físicos e psicológicos durante o cárcere e fora dele, assim como na redução de gastos relativos ao deslocamento do recluso para atendimentos na rede de atenção à saúde e uso desnecessário de medicamentos na prisão.
As limitações deste estudo se referiram ao tamanho da amostra, uma vez que somente os artigos disponibilizados sem restrição pelo Portal de Periódicos da Capes, além daqueles do PePSIC e do SciELO, puderam ser acessados e incluídos na pesquisa. Portanto, esse fato pode ter causado uma sub-representação do rol de pesquisas referente ao tema e à questão norteadora deste estudo. Outra limitação se referiu ao fato de que a maioria dos estudos primários excluídos concentraram seus resultados apenas na análise estatística da ocorrência da depressão, não incluindo estudos estatísticos referentes aos fatores sociodemográficos, institucionais e às características clínicas que poderiam estar relacionados à ocorrência da depressão na população investigada.
Vale ainda salientar que, se levarmos em consideração o fato de o Brasil possuir a terceira maior população carcerária do mundo, há um número reduzido de publicações no cenário nacional. Por esse motivo, sugere-se que novas pesquisas visando à compreensão do transtorno depressivo e seus efeitos na saúde da população carcerária brasileira sejam elaboradas, a fim de que os fatores relacionados à depressão na prisão se tornem visíveis na literatura e, com isso, auxiliem o processo de tomada de decisões na atenção à saúde das pessoas presas, bem como na elaboração de estratégias de ação mais assertivas direcionadas a esse público.
Finalmente, espera-se que os profissionais envolvidos na atenção prestada à saúde prisional possam qualificar a sua prática e, além de identificar e tratar desordens mentais, também se atentem aos fatores de risco e de proteção existentes para a depressão no ambiente prisional.
ReferênciasAfonso, L. P. V. (2012). Adaptação à prisão: Estudo das relações entre os processos de coping, “marcadores” de bem-estar e ajustamento psicológico (Dissertação de mestrado). Universidade do Minho, Portugal.AfonsoL. P. V.2012Dissertação de mestradoUniversidade do MinhoPortugalAraújo, F. A. F. M., Nakano, T. C., & Gouveia, M. L. A. (2009). Prevalência de depressão e ansiedade em detentos. Avaliação Psicológica, 8(3), 381-390.AraújoF. A. F. M.NakanoT. C.GouveiaM. L. A.2009Prevalência de depressão e ansiedade em detentos83381390Beyen, T. K., Dadi, A. F., Dachew, B. A., Muluneh, N. Y., & Bisetegn, T. A. (2017). More than eight in every nineteen inmates were living with depression at prisons of Northwest Amhara regional state, Ethiopia, a cross sectional study design. BMC Psychiatry, 17(31), 1-9. doi: 10.1186/s12888-016-1179-9BeyenT. K.DadiA. F.DachewB. A.MulunehN. Y.BisetegnT. A.2017More than eight in every nineteen inmates were living with depression at prisons of Northwest Amhara regional state, Ethiopia, a cross sectional study design17311910.1186/s12888-016-1179-9Boothby, J. L., & Durham, T. W. (1999). Screening for depression in prisoners using the Beck Depression Inventory. Criminal Justice and Behavior, 26(1), 107-124. doi: 10.1177/0093854899026001006BoothbyJ. L.DurhamT. W.1999Screening for depression in prisoners using the Beck Depression Inventory26110712410.1177/0093854899026001006Botelho, L. L. R., Almeida Cunha, C. C., & Macedo, M. (2011). O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais. Gestão e Sociedade, 5(11), 121-136. doi: 10.21171/ges.v5i11.1220BotelhoL. L. R.Almeida CunhaC. C.MacedoM.2011O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais51112113610.21171/ges.v5i11.1220Bowler, N., Phillips, C., & Rees, P. (2018). The association between imported factors and prisoners’ mental health: Implications for adaptation and intervention. International Journal of Law and Psychiatry, 57, 61-66. doi: 10.1016/j.ijlp.2018.01.001BowlerN.PhillipsC.ReesP.2018The association between imported factors and prisoners’ mental health: Implications for adaptation and intervention57616610.1016/j.ijlp.2018.01.001Campo, A. F., Díaz, L. A., & Rueda, G. E. (2006). Validity of the brief Zung’s scale for screening major depressive episode among the general population from Bucaramanga, Colombia. Biomedica, 26(3), 415-423. doi: 10.7705/biomedica.v26i3.360CampoA. F.DíazL. A.RuedaG. E.2006Validity of the brief Zung’s scale for screening major depressive episode among the general population from Bucaramanga, Colombia26341542310.7705/biomedica.v26i3.360Canazaro, D., & Argimon, I. I. L. (2010). Características, sintomas depressivos e fatores associados em mulheres encarceradas no estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, 26(7), 1323-1333. doi: 10.1590/S0102-311X2010000700011CanazaroD.ArgimonI. I. L.2010Características, sintomas depressivos e fatores associados em mulheres encarceradas no estado do Rio Grande do Sul, Brasil2671323133310.1590/S0102-311X2010000700011Colombaroli, A. C. M. (2013, 25 de fevereiro). Efeitos sociológicos e psicológicos do cárcere. Diritto.it. Recuperado de https://bit.ly/3yrxFdBColombaroliA. C. M.25022013,Efeitos sociológicos e psicológicos do cárcerehttps://bit.ly/3yrxFdBConstantino, P., Assis, S. G., & Pinto, L. W. (2016). O impacto da prisão na saúde mental dos presos do estado do Rio de Janeiro, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 21(7), 2089-2099. doi: 10.1590/1413-81232015217.01222016ConstantinoP.AssisS. G.PintoL. W.2016O impacto da prisão na saúde mental dos presos do estado do Rio de Janeiro, Brasil2172089209910.1590/1413-81232015217.01222016Faro, A., & Pereira, M. E. (2013). Medidas do estresse: Uma revisão narrativa. Psicologia, Saúde & Doenças, 14(1), 101-124.FaroA.PereiraM. E.2013Medidas do estresse: Uma revisão narrativa141101124Fazel, S., & Danesh, J. (2002). Serious mental disorder in 23000 prisoners: A systematic review of 62 surveys. Lancet, 359(9306), 545-550. doi: 10.1016/S0140-6736(02)07740-1FazelS.DaneshJ.2002Serious mental disorder in 23000 prisoners: A systematic review of 62 surveys359930654555010.1016/S0140-6736(02)07740-1Fazel, S., Hayes, A. J., Bartellas, K., Clerici, M., & Trestman, R. (2016). Mental health of prisoners: Prevalence, adverse outcomes and interventions. Lancet Psychiatry, 3(9), 871-881. doi: 10.1016/S2215-0366(16)30142-0FazelS.HayesA. J.BartellasK.ClericiM.TrestmanR.2016Mental health of prisoners: Prevalence, adverse outcomes and interventions3987188110.1016/S2215-0366(16)30142-0Fonseca, M. L. G., Guimarães, M. B. L., & Vasconcelos, E. M. (2008). Sofrimento difuso e transtornos mentais comuns: Uma revisão bibliográfica. Revista de APS, 11(3), 285-294.FonsecaM. L. G.GuimarãesM. B. L.VasconcelosE. M.2008Sofrimento difuso e transtornos mentais comuns: Uma revisão bibliográfica113285294Furtado, F. M. S. F. (2016). Vivendo a margem: Prevalência e vulnerabilidade ao transtorno mental comum em mulheres residentes em cidades rurais paraibanas (Tese de doutorado, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa). Recuperado de https://bit.ly/3ocnrrgFurtadoF. M. S. F.2016Tese de doutoradoUniversidade Federal da ParaíbaJoão Pessoahttps://bit.ly/3ocnrrgGalvão, T. F., Pansani, T. S. A., & Harrad, D. (2015). Principais itens para relatar revisões sistemáticas e meta-análises: A recomendação PRISMA. Epidemiologia e Serviços de Saúde, 24(2), 335-342. doi: 10.5123/S1679-49742015000200017GalvãoT. F.PansaniT. S. A.HarradD.2015Principais itens para relatar revisões sistemáticas e meta-análises: A recomendação PRISMA24233534210.5123/S1679-49742015000200017Gois, S. M., Santos, H. P. O., Jr., Silveira, M. F. A., & Gaudêncio, M. M. P. (2012). Para além das grades e punições: Uma revisão sistemática sobre a saúde penitenciária. Ciência & Saúde Coletiva , 17(5), 1235-1246. doi: 10.1590/S1413-81232012000500017GoisS. M.SantosH. P. O.Jr.SilveiraM. F. A.GaudêncioM. M. P.2012Para além das grades e punições: Uma revisão sistemática sobre a saúde penitenciária1751235124610.1590/S1413-81232012000500017Gonçalves, L. C., & Gonçalves, R. (2012). Agressividade, estilo de vida criminal e adaptação à prisão. Psicologia USP, 23(3), 559-584. doi: 10.1590/S0103-65642012005000013GonçalvesL. C.GonçalvesR.2012Agressividade, estilo de vida criminal e adaptação à prisão23355958410.1590/S0103-65642012005000013Madzharov, E. A. (2016). Age-psychological characteristics of inmates. Procedia-Social and Behavioral Sciences, 217, 92-100. doi: 10.1016/j.sbspro.2016.02.035MadzharovE. A.2016Age-psychological characteristics of inmates2179210010.1016/j.sbspro.2016.02.035Ministério da Justiça. (2014). Levantamento nacional de informações penitenciárias (Infopen) - junho de 2014. Brasília, DF: Departamento Penitenciário Nacional.Ministério da Justiça2014Brasília, DFDepartamento Penitenciário NacionalMinistério da Saúde. (2005). Plano nacional de saúde no sistema penitenciário (2a ed.). Brasília, DF: Editora MS.Ministério da Saúde20052aBrasília, DFEditora MSMinistério da Saúde. (2010). Rastreamento (Cadernos de Atenção Primária, Vol. 29). Brasília, DF. Recuperado de https://bit.ly/3HW55nDMinistério da Saúde2010Rastreamento29Brasília, DFhttps://bit.ly/3HW55nDMinistry of Health. (2008). Identification of common mental disorders and management of depression in primary care. An evidence-based best practice guideline. Wellington, New Zeland: New Zealand Guidelines Group. Recuperado de https://bit.ly/3A4HpLYMinistry of Health2008Wellington, New ZelandNew Zealand Guidelines Grouphttps://bit.ly/3A4HpLYMojica, C. A., Sáenz, D. A., & Rey-Anacona, C. A. (2009). Riesgo suicida, desesperanza y depresión en internos de un establecimiento carcelario colombiano. Revista Colombiana de Psiquiatría, 38(4), 681-692.MojicaC. A.SáenzD. A.Rey-AnaconaC. A.2009Riesgo suicida, desesperanza y depresión en internos de un establecimiento carcelario colombiano384681692Munzlinger, E., Narcizo, F. B., & Queiroz, J. E. R. (2012). Sistematização de revisões bibliográficas em pesquisas da área de IHC. Trabalho apresentado no 11o Simpósio Brasileiro sobre Fatores Humanos em Sistemas Computacionais, Porto Alegre, RS, Brasil.MunzlingerE.NarcizoF. B.QueirozJ. E. R.2012Trabalho apresentado11oSimpósio Brasileiro sobre Fatores Humanos em Sistemas ComputacionaisPorto Alegre, RS, BrasilNational Collaborating Centre for Mental Health. (2011). Common mental disorders: The NICE guideline on identification and pathways to care. London, England: RCPsych.National Collaborating Centre for Mental Health2011London, EnglandRCPsychNunes, M. A., Pinheiro, A. P., Bessel, M., Brunoni, A. R., Kemp, A. H., Benseñor, I. M., Chor, D., Barreto, S., & Schmidt, M. I. (2016). Common mental disorders and sociodemographic characteristics: Baseline findings of the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Revista Brasileira de Psiquiatria, 38(2), 91-97. doi: 10.1590/1516-4446-2015-1714NunesM. A.PinheiroA. P.BesselM.BrunoniA. R.KempA. H.BenseñorI. M.ChorD.BarretoS.SchmidtM. I.2016Common mental disorders and sociodemographic characteristics: Baseline findings of the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil)382919710.1590/1516-4446-2015-1714Osasona, S. O., & Koleoso, O. N. (2015). Prevalence and correlates of depression and anxiety disorder in a sample of inmates in a Nigerian prison. International Journal of Psychiatry in Medicine, 50(2), 203-218. doi: 10.1177/0091217415605038OsasonaS. O.KoleosoO. N.2015Prevalence and correlates of depression and anxiety disorder in a sample of inmates in a Nigerian prison50220321810.1177/0091217415605038Pinese, C. S. V., Furegato, A. R. F., & Santos, J. L. F. (2010). Demographic and clinical predictors of depressive symptoms among incarcerated women. Annals of General Psychiatry, 9(34), 1-7. doi: 10.1186/1744-859X-9-34PineseC. S. V.FuregatoA. R. F.SantosJ. L. F.2010Demographic and clinical predictors of depressive symptoms among incarcerated women9341710.1186/1744-859X-9-34Pinheiro, I., & Cardoso, J. (2011). Vulnerabilidade ao stress prisional e ao risco de suicídio na população reclusa: Estudo exploratório. Sociedade Portuguesa de Psiquiatria, Psicologia e Justiça, 12(4), 5-25. Recuperado de https://bit.ly/3QUaKi3PinheiroI.CardosoJ.2011Vulnerabilidade ao stress prisional e ao risco de suicídio na população reclusa: Estudo exploratório124525https://bit.ly/3QUaKi3Remor, E. A. (1999). Psicologia da saúde: Apresentação, origem e perspectivas. Psico, 30(1), 205-217.RemorE. A.1999Psicologia da saúde: Apresentação, origem e perspectivas301205217Santos, T. (Org.). (2017). Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) atualização - junho de 2016. Brasília, DF: Ministério da Justiça e Segurança Pública.SantosT.2017Brasília, DFMinistério da Justiça e Segurança PúblicaShrestha, G., Yadav, D. K., Sapkota, N., Baral, D., Yadav, B. K., Chakravartty, A., & Pokharel, P. K. (2017). Depression among inmates in a regional prison of eastern Nepal: A cross-sectional study. BMC Psychiatry , 17(348), 1-9. doi: 10.1186/s12888-017-1514-9ShresthaG.YadavD. K.SapkotaN.BaralD.YadavB. K.ChakravarttyA.PokharelP. K.2017Depression among inmates in a regional prison of eastern Nepal: A cross-sectional study173481910.1186/s12888-017-1514-9Straub, R. O. (2014). Psicologia da saúde: Uma abordagem psicossocial (3a ed.). Porto Alegre, RS: Artmed.StraubR. O.20143aPorto Alegre, RSArtmedUribe-Rodriguez, A. F., Martínez-Rodriguez, J. M., & López-Romero, K. A. (2012). Depresión y ansiedad estado/rasgo en internos adscritos al “Programa de Inducción al Tratamiento Penitenciario” en Bucaramanga, Colombia. Criminalidad, 54(2), 47-60.Uribe-RodriguezA. F.Martínez-RodriguezJ. M.López-RomeroK. A.2012Depresión y ansiedad estado/rasgo en internos adscritos al “Programa de Inducción al Tratamiento Penitenciario” en Bucaramanga, Colombia5424760Vélez-Álvarez, C., Barrera-Valencia, C., Benito-Devia, A.V., Figueroa-Barrera, M., & Franco-Idarraga, S. M. (2016). Study of depressive symptoms according to Zung’s self-rating scale on men deprived of freedom in a city of Colombia. Revista Española de Sanidad Penitenciaria, 18(2), 43-48. doi: 10.4321/S1575-06202016000200002Vélez-ÁlvarezC.Barrera-ValenciaC.Benito-DeviaA.V.Figueroa-BarreraM.Franco-IdarragaS. M.2016Study of depressive symptoms according to Zung’s self-rating scale on men deprived of freedom in a city of Colombia182434810.4321/S1575-06202016000200002Whittemore, R., & Knafl, K. (2005). The integrative review: Updated methodology. Journal of Advanced Nursing, 52(5), 546-553. doi: 10.1111/j.1365-2648.2005.03621.xWhittemoreR.KnaflK.2005The integrative review: Updated methodology52554655310.1111/j.1365-2648.2005.03621.xWorld Health Organization. (2017). Depression and other common mental disorders: Global health estimates. Geneva, Switzerland: WHO Document Production Services. Recuperado de https://bit.ly/3y42SSmWorld Health Organization2017Geneva, SwitzerlandWHO Document Production Serviceshttps://bit.ly/3y42SSm