A cultura dos mitos: do regime de historicidade Karajá e sua potência “fria"

Autores

DOI:

https://doi.org/10.11606/1678-9857.ra.2022.192801

Palavras-chave:

Inỹ-Karajá, Mitologia, Tempo, História

Resumo

Esse artigo toma a caracterização de Lévi-Strauss das “sociedades frias” como inspiração para discutir o regime de historicidade karajá, um povo do Brasil Central. Sua mitologia narra um tempo da criação, onde diversos aspectos do mundo são criados e a humanidade adquire os conhecimentos que hoje a caracterizam enquanto tal. Já a ação no mundo atual não é criadora: antes, as ações fazem aparecer formas já estavam lá, desde o princípio, pois inscritas pelo mito. Dessa maneira, as ações atuais fazem aparecer ou uma continuidade em relação aos tempos antigos, pois elicitam os mesmos nexos relacionais, ou uma ruptura marcada para com “a cultura”. Em um caso como no outro, o que é colocado em evidência é a potência “fria” de seu regime de historicidade, ou seu caráter contrahistórico. Para dar conta desse regime, escapando da ideia história formulada em termos de mudança e continuidade, argumento que é preciso separar o problema da história do problema do tempo.

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Biografia do Autor

  • Eduardo Soares Nunes, Universidade Federal do Oeste do Pará. Santarém, PA, Brasil

    Eduardo Soares Nunes é doutor em antropologia pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade de Brasília - UnB; pesquisador do Laboratório de Antropologias da T/terra (DAN/UnB); professor do Bacharelado em Antropologia do Programa de Antropologia e Arqueologia da Universidade Federal do Oeste do Pará.

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Publicado

2022-04-27

Edição

Seção

Dossiê - Entre a mitologia e a etnografia: transformações nas Américas indígenas

Como Citar

Nunes, E. S. (2022). A cultura dos mitos: do regime de historicidade Karajá e sua potência “fria". Revista De Antropologia, 65(1), e192801. https://doi.org/10.11606/1678-9857.ra.2022.192801