Concepção neoliberal da corrupção no discurso contábil da JBS
DOI:
https://doi.org/10.11606/issn.1982-6486.rco.2023.192429Palavras-chave:
Corrupção, Neoliberalismo, Contabilidade crítica, Relatórios contábeis, Análise crítica de discursoResumo
A corrupção é um fenômeno social amplamente estudado que permeia o debate público brasileiro com maior intensidade nos últimos anos. Neste artigo assumimos que a ideologia neoliberal propaga uma concepção particular de corrupção situada predominantemente nos agentes públicos cujo remédio passa, por consequência, pelo enfraquecimento do Estado. Esta concepção é amplamente difundida por organizações internacionais que apresentam soluções pré-concebidas para eliminar a corrupção. Neste sentido, este artigo se propõe a investigar de que forma se apresentam os discursos atrelados à corrupção divulgados nos relatórios corporativos anuais de uma grande empresa envolvida em caso de corrupção. Para isso foi utilizada a Análise Crítica do Discurso, mais especificamente o modelo tridimensional de Fairclough. Entre os principais achados foi possível concluir que em seus relatórios a empresa procura se eximir de responsabilidade pelos atos de corrupção, suavizando-os e atribuindo-lhes a um grupo específico dentro da organização. Ademais, foi possível identificar um alinhamento com a concepção neoliberal da corrupção por meio da responsabilização do Estado enquanto agente da corrupção, bem como pela adoção de soluções prontas difundidas e legitimadas por organizações internacionais de orientação neoliberal.
Downloads
Referências
Abramo, C. W. (2005). Percepções pantanosas: a dificuldade de medir a corrupção. Novos estudos CEBRAP, n. 73, p. 33-37. https://doi.org/10.1590/S0101-33002005000300003
Annisette, M., Cooper, C., & Gendron, Y. (2017). Editorial: After 25 years, how should we proceed? Critical Perspectives on Accounting, 43, 1–4. http://dx.doi.org/10.1016/j.cpa.2017.02.003
Armenic, J. (1992). A Case Study in Corporate Financial Reporting: Massey-Ferguson`s Visible Accounting Decisions 1970-1987. Critical Perspectives on Accounting, 3, 1-43. https://doi.org/10.1016/1045-2354(92)90013-H
Arnold, P., & Hammond, T. (1994). The Role of Accounting in Ideological Conflict: Lessons from the South African Divestment Movement. Accounting, Organizations and Society, 19, 111-126. https://doi.org/10.1016/0361-3682(94)90014-0
Ashraf, M. J., Muhammad, F., & Hopper, T. (2018). Accounting signifiers, political discourse, popular resistance and legal identity during Pakistan Steel Mills attempted privatization. Critical Perspective on Accounting, p. 1-26. https://doi.org/10.1016/j.cpa.2018.08.002
Bedirhanoğlu, P. (2007). The neoliberal discourse on corruption as a means of consent building: reflections from post-crisis Turkey. Third World Quarterly, v. 28, n. 7, p. 1239-1254. https://doi.org/10.1080/01436590701591770
Bratsis, P. (2014). Political Corruption in the Age of Transnational Capitalism: From the Relative Autonomy of the State to the White Man’s Burden. Historical Materialism, 22(1), 105-128. https://doi.org/10.1163/1569206X-12341334
Brei, Z. A. (1996). Corrupção: dificuldades para definição e para um consenso. Revista de Administração Pública (RAP), Rio de Janeiro. 30 (I) 64-77.
Brito, A. (2015). BBC Brasil. 'Cultura de corrupção' não é desculpa para pagar propina, diz especialista em 'sanear' empresas. https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150929_entrevista_pohlmann_ab
Brown, E., & Cloke, J. Neoliberal reform, governance and corruption in the south: assessing the international anti-corruption crusade. Antipode, 36(2), 272-294. 2004. https://doi.org/10.1111/j.1467-8330.2004.00406.x
Chiapello, E. (2017). Critical accounting research and neoliberalism. Critical Perspectives on Accounting, 43, 47-64. https://doi.org/10.1016/j.cpa.2016.09.002
Chwastiak, M., & Young, J. J. (2003). Silences in Annual Reports. Critical Perspectives on Accounting. 14, 533–552. DOI: 10.1016/S1045-2354(02)00162-4
Comitê de Pronunciamentos Contábeis. (2019). Pronunciamento Técnico CPC 00 (R2): Estrutura Conceitual para Relatório Financeiro. DF: CPC.
Domech, P. A. (2007). Discurso contable, ideología e informes anuales: un enfoque interpretative. Contaduría Universidad de Antioquia, 51, 41-64. https://doi.org/10.17533/udea.rc.2147
Fairclough, N, & Melo, I. F. (2012). Análise Crítica do Discurso como Método em Pesquisa Social Científica. Linha d'Água, 25(2), 307-329. https://doi.org/10.11606/issn.2236-4242.v25i2p307-329
Fairclough, N. (2016). Discurso e Mudança Social. 2. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília.
Farjaudon, A-L., & Morales, J. (2013). In search of consensus: The role of accounting in the definition and reproduction of dominant interests. Critical Perspectives on Accounting, v. 24, n. 2, p. 154-171. https://doi.org/10.1016/j.cpa.2012.09.010
Fernandes, L. (2020). Sociedade Brasileira de Economia Política. Apontamentos iniciais para a crítica da economia política do “lavajatismo”: neoliberalismo e a mercantilização do “combate à corrupção”. https://enep.sep.org.br/uploads/1138_1583527354_ArtigoA_economia_pol%C3%ADtica_do_lavajatismo_PDF_1_pdf_ide.pdf.
Ferreira, A. B. de H. (2001) Minidicionário Aurélio. 5. ed. Nova Fronteira.
Filgueiras, F. (2008). Corrupção, democracia e legitimidade. Belo Horizonte: Editora UFMG.
Filgueiras, F. (2012). Marcos Teóricos da Corrupção. In: Corrupção: ensaios e críticas. Belo Horizonte: Editora UFMG.
Foucault, M. (2008). Arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária.
Gadelhâ, U., & Tenório, A. (2018). Faces da corrupção: um mal que atinge a sociedade brasileira. Folha de Pernambuco. https://www.folhape.com.br/politica/faces-da-corrupcao-um-mal-que-atinge-a-sociedade-brasileira/63708/.
Gallhofer, S., & Haslam, J. (1991). The Aura of Accounting in the Context of a Crisis: Germany and the First World War. Accounting, Organizations and Society, pp. 487-520. https://doi.org/10.1016/0361-3682(91)90039-H
Gardiner, J. (2007). Defining Corruption. In: Heidenheimer, A.J.; Johnston, M. Political Corruption: concepts and contexts, Heidenheimer and Johnston, editors.
Gazeta Digital. (2005). Corrupção é um mal do século. https://www.gazetadigital.com.br/editorias/opiniao/corrupcao-e-um-mal-do-seculo/90487.
Granovetter, M. (2006). A construção social da corrupção. Política & Sociedade, v. 5, n. 9, p. 11-38. https://doi.org/10.5007/%25x
Hawley, S. (2000). Exporting corruption: privatisation, multinationals and bribery. https://agris.fao.org/agris-search/search.do?recordID=GB2013203471.
Haynes, K. (2016). Accounting as gendering and gendered: A review of 25 years of critical accounting research on gender. Critical Perspectives on Accounting, http://dx.doi.org/10.1016/j.cpa.2016.06.004.
Heidenheimer, A. J. (1970). The context of analysis. In: Heidenheimer, A. J. Political corruption - readings in comparative analysis. New York, Holt, Rinehart and Winston.
Homero Junior, P. F. (2017). Paradigma e Ordem do Discurso da Pesquisa Contábil Brasileira. Advances in Scientific and Applied Accounting. ISSN 1983-8611. São Paulo v.10, n.1 p. 039 – 053. http://dx.doi.org/10.14392/asaa.2017100103
Hope, K. R. (1987). Administrative corruption and administrative reform in developing states. Corruption and Reform, 2(2):127-47.
Huntington, S. P. (2002). Modernization and Corruption. In: Heidenheimer, A. and Johnston, M. Political corruption: concepts and contexts. 3rd ed.
Irigaray, H. A. R., Vergara, S. C., & Araujo, R. G. Responsabilidade Social Corporativa: o que revelam os relatórios sociais das empresas. Organizações & Sociedade, v. 24, n. 80, p. 73-88, 2017. https://doi.org/10.1590/1984-9230804
Jain, A. K. (2001). Corruption: a review. Journal of Economic Surveys, 15, pp. 71-120. https://doi.org/10.1111/1467-6419.00133
JBS. (2017). Relatório da Administração JBS 2017. https://ri.jbs.com.br/informacoes-financeiras/relatorios-anuais/.
JBS. (2018). Relatório da Administração JBS 2018. https://ri.jbs.com.br/informacoes-financeiras/relatorios-anuais/.
Manassian, A. (2000). Look who's talking: a postcolonial critique of the discourse on international accounting. Calgary.
Martin, J. R., & White, P. R. R. (2005). The language of evaluation: appraisal in English. New York: Palgrave Macmillan.
Matos, O. V. H, & Formentin, C. N. (2016). Veja e Carta Capital: a polarização política das páginas às ruas. Em Debate, n. 16, p. 15-40.
Merino, B. D., Mayper, A. G., & Tolleson, T. D. (2010). Neoliberalism, deregulation and Sarbanes-Oxley: the legitimation of a failed corporate governance model. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 23(6), 774-792. https://doi.org/10.1108/09513571011065871
Miranda, L. F. (2018). Unificando os conceitos de corrupção: uma abordagem através da nova metodologia dos conceitos. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 25. Brasília, janeiro/abril, pp 237-272. https://doi.org/10.1590/0103-335220182507
Neimark, M. (1992). The Hidden Dimensions of Annual Reports: Sixty Years of Social Conflict at General Motors. New York: Markus Wiener Publishing.
OECD. (2020b). Fighting corruption at the OECD. https://www.oecd.org/corruption/fightingcorruptionattheoecd.htm#:~:text=The%20OECD%20has%20been%20a,in%20member%20countries%20and%20beyond.
OECD. (2020). OECD Work on Anti-corruption and Integrity. https://www.oecd.org/corruption-integrity/about/.
Pecheux, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Campinas, SP. Uncamp, 2009.
Resende, V. M., & Ramalho, V. (2017). Análise de Discurso Crítica. 2. ed. São Paulo: Contexto.
Schneider, A. (2012). Banco Mundial. In: Corrupção: ensaios e críticas. Belo Horizonte: Editora UFMG.
Scott, J. C. (1972). Comparative political corruption. Prentice-Hall.
Souza, J. (2019). A elite do atraso: da escravidão a Bolsonaro. Editora Estação Brasil.
The World Bank. (2020b). Combating Corruption. https://www.worldbank.org/en/topic/governance/brief/anti-corruption.
The World Bank. (2020). Who we are. https://www.worldbank.org/en/who-we-are.
Thompson, J. B. (2011). Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 9. ed. Tradução do Grupo de Estudos sobre Ideologia, comunicação e representações sociais da pós-graduação do Instituto de Psicologia da PUCRS. Petrópolis, RJ: Vozes.
Tinker, T., & Neimark, M. (1987). The role of annual reports in gender and class contradictions at General Motors: 1917–1976. Accounting, Organizations and Society, v. 12, n. 1, p. 71-88.
Transparência Internacional (TI). (2020a). Índice de Percepção da Corrupção 2019. https://transparenciainternacional.org.br/ipc/.
Transparency International (TI). (2020b). Corruption ‘fighters’ toolkit: civil society experiences and emerging strategies. https://www.transparency.org/en/publications/corruption-fighters-toolkit-civil-society-experiences-and-emerging-strategi#.
Transparency International (TI). (2020). Our Organisation. https://www.transparency.org/whoweare/organisation.
Warde Junior, W. J. (2018). O espetáculo da corrupção: como um sistema corrupto e o modo de combatê-lo estão destruindo o país. LeYa.
Whyte, D. (2007). The crimes of neo-liberal rule in occupied Iraq. British Journal of Criminology, v. 47, n. 2, p. 177-195. https://doi.org/10.1093/bjc/azl065.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Copyright (c) 2023 Beatriz Gil Emoingt, Marcelo Almeida de Carvalho Silva

Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0 International License.
A RCO adota a política de Acesso Livre (Libre Open Access), sob o acordo padrão Creative Commons (CC BY-NC-ND 4.0). O acordo prevê que:
- A submissão de texto autoriza sua publicação e implica compromisso de que o mesmo material não esteja sendo submetido a outro periódico. O original é considerado definitivo;
- Autores mantêm os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Attributionque permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria e publicação inicial nesta revista;
- Autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não-exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com necessário reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista;
- Autores têm permissão e são estimulados a publicar e distribuir seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) antes ou durante o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado (Veja O Efeito do Acesso Livre);
- A revista não paga direitos autorais aos autores dos textos publicados;
- O detentor dos direitos autorais da revista, exceto os já acordados no acordo de Libre Open Access (CC BY-NC-ND 4.0), é o Departamento de Contabilidade da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Não são cobradas taxas de submissão ou de publicação.
São aceitos até 4 autores por artigo. Casos excepcionais devidamente justificados poderão ser analisados pelo Comitê Executivo da RCO. São considerados casos excepcionais: projetos multi-institucionais; manuscritos resultantes da colaboração de grupos de pesquisa; ou que envolvam grandes equipes para coleta de evidências, construção de dados primários e experimentos comparados.
É recomendada a ordem de autoria por contribuição, de cada um dos indivíduos listados como autores, especialmente no desenho e planejamento do projeto de pesquisa, na obtenção ou análise e interpretação de dados e redação. Os autores devem declarar as efetivas contribuições de cada autor, preenchendo a carta ao editor, logo no início da submissão, responsabilizando-se pelas informações dadas.
É permitida a troca de autores durante todo o processo de avaliação e, antes da publicação do manuscrito. Os autores devem indicar a composição e ordem final de autoria no documento assinado por todos os envolvidos no aceite para publicação. Caso a composição e ordem de autoria seja diferente da informada anteriormente no sistema, todos autores anteriormente listados deverão se manifestar favoráveis.
No caso de identificação de autoria sem mérito ou contribuição (ghost, guest or gift authorship), a RCO segue o procedimento recomendado pela COPE.