Chamada de trabalhos: Revista Teresa, nº 24. Dossiê: História e ficção na literatura brasileira

2021-03-25

A revista Teresa, publicação do Programa de Pós-Graduação em Literatura Brasileira da Universidade de São Paulo, espera receber contribuições para o seu próximo número, conforme especificações abaixo. Solicitamos aos autores e autoras que, ao enviarem os manuscritos, observem e respeitem rigorosamente as normas de publicação expostas neste site, na seção “Submissões”. O prazo para envio de trabalhos é 31 de julho de 2021. Aceitamos artigos e resenhas de doutores, doutorandos e mestres. Aceitamos resenhas de mestrandos.

Dossiê: História e ficção na literatura brasileira

      Em crônica de 15 de março de 1877, na revista Ilustração Brasileira, sob o pseudônimo de Manasses, Machado de Assis escreveu: “Um contador de histórias é justamente o contrário de um historiador, não sendo um historiador, afinal de contas, mais do que um contador de histórias”. No jogo de palavras, na brincadeira com a “engenhosidade da língua portuguesa” – para usar as próprias palavras do autor –, coloca-se uma questão que hoje é fundamental tanto para a teoria literária quanto para a historiografia: ambas, história e ficção, são construções narrativas. Se a primeira intenta a apreensão de uma suposta verdade dos fatos, a segunda delas usa mão para conferir verossimilhança histórica à ficção, ou mesmo para contestar-lhes, propondo outra perspectiva ao relato historiográfico.

     Na literatura brasileira, já encontramos esse diálogo tenso e produtivo entre ficção e história nas manifestações literárias das letras coloniais, como nos poemas épicos de Basílio da Gama (O Uraguai), Santa Rita Durão (Caramuru) e Cláudio Manoel da Costa (Vila Rica). Após a Independência, sobretudo a partir da criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), verificou-se o empenho pelo desenvolvimento tanto de uma historiografia nacional quanto pela instituição de um cânone literário brasileiro. É nesse momento que surgem tentativas de reviver, no século XIX, a épica antiga – como faz Gonçalves de Magalhães, com A confederação dos tamoios, em 1856) – e, de modo mais satisfatório, fazer uso de um gênero então bastante popular na literatura europeia – o romance histórico –, que corresponde à escolha de José de Alencar, o qual, bebendo na fonte de Walter Scott, empenha-se em desenhar, por meio de sua obra, toda uma geografia e história do país, conforme ele mesmo declara no texto “Bênção paterna”, que serve de prefácio a Sonhos d’ouro (1872).

     Se o projeto alencariano se sustenta, hoje se discute, em uma plataforma idealista e conservadora, filiada aos interesses de uma elite escravocrata, passamos a encontrar, já em Machado de Assis, uma leitura menos idealizada e mais crítica do processo histórico, como demonstraram os trabalhos seminais de Raymundo Faoro, Roberto Schwarz e John Gledson. Não se trata mais, no caso do autor de Esaú e Jacó, de enaltecer as belezas e faustos nacionais, e sim de repensar as bases violentas e desiguais da formação social e histórica do país, busca constante na produção de muitos autores a partir desse momento, como em Lima Barreto, nos modernistas – como em Mário de Andrade, Oswald e Drummond –, nos escritores da geração de 1930. 

     É nesse meio tempo em que também se processa uma releitura dos pressupostos do trabalho historiográfico: a partir da Escola de Annales, fundada em 1929, propõe-se uma revisão da concepção positivista da pesquisa histórica, de modo a superar uma concepção meramente factual da História e colocar em questão tanto a maneira com que se interrogam as fontes quanto a própria escrita da narrativa historiográfica. A escrita pós-modernista incorpora esses questionamentos por meio da metaficção historiográfica, que, no caso da literatura brasileira, possui como exemplos obras de Rubem Fonseca (Agosto), Márcio Souza (Galvez, imperador do Acre) e Ana Miranda (Boca do inferno).

     O novo número da Revista Teresa convida pesquisadores e pesquisadoras para um dossiê sobre “História e ficção na literatura brasileira”. Serão aceitas contribuições que abordem o diálogo entre essas duas áreas nos mais diversos gêneros ficcionais: na poesia lírica, nas narrativas (poemas épicos, contos, romances), no drama, entre outros.

 

Organizadores do volume:​​​​​​​

Ricardo Souza de Carvalho (USP)

Marcos Lemos Ferreira dos Santos (USP)

Patrícia Trindade Nakagome (UnB) 

Maged ElGebaly (Aswan University)

 

                                        ¿No hay quien nos desate?, Francisco de Goya