Bastilhas de pobres e prisões da democracia: uma reflexão sobre um "trade-off" entre liberdade e (auto)controle

Autores

DOI:

https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2020.176240

Palavras-chave:

Prisões, Autocontrole, Autogoverno, Democracia

Resumo

Este ensaio pretende analisar a relação entre luta de classes e prisão a partir de duas de suas dimensões nas sociedades modernas: como mecanismo repressivo que opera contra vanguardas políticas e como mecanismo produtor de disciplina sobre amplas camadas sociais, mais especificamente, as classes despossuídas. Para cumprir este objetivo, recorremos à imagem da bastilha tradicional, para ilustrar a primeira dimensão, e da bastilha dos pobres, para nos referirmos à segunda. As bastilhas dos pobres se constituíram como meio de transformação antropológica do povo, fortemente vinculadas a uma ideia de democracia como autogoverno. O autocontrole, a ser adquirido na prisão, estava inerentemente vinculado ao autogoverno da democracia, como em um trade-off. Esse foi o caso na elaboração do Iluminismo, dos Quakers do século XVII a Beccaria e ao Panóptico de Bentham. O caso dos Estados Unidos é exemplar nesse sentido, pois nos permite compreender a relação entre o autocontrole, inscrito no projeto da disciplina prisional, e o autogoverno, como livre exercício da cidadania política.

Downloads

Os dados de download ainda não estão disponíveis.

Biografia do Autor

  • Dario Melossi, Universidade de Bolonha

    Professor alma mater da Universidade de Bolonha e distinguished affiliated scholar do Center for the Study of Law and Society, da Universidade da Califórnia/Berkley. Depois do bacharelado em Direito, na Universidade de Bolonha e do doutorado em Sociologia na Universidade da Califórnia/Santa Bárbara, foi professor associado da Universidade da Califórnia/Davis, até que nos anos de 1990 voltou para Bolonha. Publicou Cárcere e fábrica: as origens do sistema penitenciário (séculos XVI-XIX) (1977, junto com Massimo Pavarini), The state of social control: A sociological study of concepts of state and social control in the making of democracy (1990) e Controlling crime, controlling society: thinking about crime in Europe and America (2008). Além disso, tem mais de duzentas outras publicações. Foi editor da revista Punishment and Society e agora é editor chefe do European Journal of Criminology. Em 2007 recebeu o International Scholarship Prize da Law and Society Association e em 2014 o European Criminology Award da Sociedade Europeia de Criminologia. Seu livro mais recente é Crime, punishment and migration (2015). Suas pesquisas em andamento dizem respeito ao processo de construção do desvio e do controle social na União Europeia, especialmente em relação aos processos migratórios.

Referências

Beaumont, Gustave de & Tocqueville, Alexis de. (1833), On the penitentiary system in the United States and its application in France. Carbondale/Edwardsville, Southern Illinois University Press, 1964.

Beccaria, Cesare. ([1764] 1999), Dos delitos e das penas. São Paulo, Revista dos Tribunais.

Dumm, Thomas L. (1987), Democracy and punishment: disciplinary origins of the United States. Madison, The University of Wisconsin Press.

Durkheim, Émile. ([1950] 2015), Leçons de sociologie. Présentation par Serge Paugam; avant-propos de Hüseyin Nail Kubali; introduction de Georges Davy. Paris, Presses Universitaires de France. Ed. bras.: (2002), Lições de sociologia. Tradução de Monica Stahel. São Paulo, Martins Fontes.

Durkheim, Émile. ([1898-1900] 1958), Professional ethics and civic morals. Glencoe, Free Press, 1958.

Federn, Paul (1919), “Zuer Psychologie der Revolution: die vaterlose Gesellschaft”. Der Oesterreichische Volkswirt, 11: 571-574, 595-598.

Fonseca, David S. (2018), “Expansion, standardization, and densification of the criminal justice apparatus: Recent developments in Brazil”. Punishment and Society, 20: 329-350.

Foucault, Michel. ([1975] 1977), Discipline and punish: the birth of the prison. Nova York, Pantheon. Ed. bras.: Foucault, Michel. (2009), Vigiar e punir: nascimento da prisão. São Paulo, Editora Vozes.

Foucault, Michel. (1978), “Governmentality”. Ideology and Consciousness 6: 5-21.

Freud, Sigmund. ([1913] 1955), Totem and taboo. In: The standard edition. Londres, Hogarth, vol. 13, pp.1-161.

Freud, Sigmund. ([1921] 1955), Group psychology and the analysis of the ego. In: The standard edition. Londres, Hogarth, vol. 18, pp. 65-141

Freud, Sigmund. ([1930] 1961), Civilization and its discontents. In: The standard edition. Londres, Hogarth, vol. 21, pp. 57-146.

Freud, Sigmund. ([1933] 1964), New introductory lectures on psychoanalysis. In: The standard edition. Londres, Hogarth, vol. 22, pp. 1-182.

Freud, Sigmund. (2019), Edição standard brasileira das Obras psicológicas completas de Sigmund Freud, vol. xix: O ego e o id, e outros trabalhos (1923-1925), eBook Kindle.

Freud, Sigmund. ([1932, 1933] 1996), “Conferência XXXI: a dissecção da personalidade psíquica”. In: Edição standard brasileira das Obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro, Imago, vol. 22.

Grandi, Dino. (1941), Bonifica umana. Two volumes. Roma, Ministero di Grazia e Giustizia.

Horkheimer, Max & Adorno, Theodor W. (1944), Dialectic of Enlightenment. Nova York, Continuum, 1989.

Ignatieff, Michael. (1978), A just measure of pain. Londres, Macmillan.

Jellinek, Georg. ([1895] 1901), The Declaration of the Rights of Men and Citizens. Nova York, Holt.

Kelsen, Hans. ([1922] 1924), “The conception of the state and social psychology”. The International Journal of Psychoanalysis, 5: 1-38 (German original in “Der Begriff der/s Staates und die Sozialpsychologie”, Imago, 8: 97-141).

Lacan, Jacques. (1998), “A coisa freudiana”. In. Écrits. Rio de Janeiro, Zahar.

Marx, Karl. (2010), Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. São Paulo, Boitempo.

Mead, George H. (1925), “The genesis of the self and social control”. In: Mead, G. H. Selected writings. Indianapolis, Bobbs-Merrill, 1964, pp. 267-293.

Melossi, Dario. (2020), “Prison, subordination, inequality: again on a marxist perspective”. In:

Lacey, N.; Soskice, D.; Cheliotis, L. K. & Xenakis, S. (eds.). Tracing the relationship between inequality, crime and punishment: space, time and politics. Oxford, Oxford University Press/British Academy.

Melossi, Dario. (2018), “The prison and the factory revisited (2017): Penality and the critique of political economy between Marx and Foucault”. In: Melossi, Dario & Pavarini, Massimo. The prison and the factory (40th anniversary edition): Origins of the penitentiary system. Londres, Palgrave Macmillan, pp. 1-24.

Melossi, Dario. (2008), Controlar el delito, controlar la sociedad: Teorias y debates sobre la cuestion criminal, del siglo xviii al xxi. Buenos Aires, Siglo Veintiuno.

Melossi, Dario. (1990), The state of social control: a sociological study of concepts of state and social control in the making of democracy. Cambridge (uk)/Nova York, Polity Press/St. Martin’s Press.

Melossi, Dario & Pavarini, Massimo. (2006), Cárcere e fábrica: as origens do sistema penitenciário (séculos xvi-xix). Rio de Janeiro, Revan.

Pateman, Carole. (1988), The sexual contract. Cambridge, Polity press.

Paz, Octavio. ([1979] 1985), “Mexico and the United States”. In: Paz, O. The labyrinth of solitude. Londres, Penguin Books, pp. 355-376.

Rusche, Georg. (1933), “Labor market and penal sanction”. Crime and Social Justice 10: 2-8.

Rusche, Georg & Kirchheimer, Otto. ([1939] 2003), Punishment and social structure. New Brunswick (nj), Transaction Publishers.

Shen, Anqi. (2018), Internal migration, crime, and punishment in contemporary China. Cham. Springer.

Soumahoro, Aboubakar. (2019), Umanità in rivolta. La nostra lotta per il lavoro e il diritto alla felicità. Milão, Feltrinelli.

Teti, Vito. (1993), La razza maledetta: origini del pregiudizio antimeridionale. Roma, manifestolibri.

Tocqueville, Alexis de. ([1835-1840] 1961), Democracy in America. Two volumes. Nova York, Schocken.

Weber, Max. ([1904-1905] 1958). The protestant ethic and the spirit of capitalism. Nova York, Scribner’s.

Downloads

Publicado

2020-12-11

Edição

Seção

Dossiê - Sociologia e Criminologia: sobreposições, tensões e conflitos

Como Citar

Melossi, D. (2020). Bastilhas de pobres e prisões da democracia: uma reflexão sobre um "trade-off" entre liberdade e (auto)controle. Tempo Social, 32(3), 229-245. https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2020.176240