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Discursos poéticos e humorísticos e seu papel no discurso político brasileiro

Release de Margareth Artur para o Portal de Revistas da USP, São Paulo, Brasil

A mentira é malvista por todos, pois mentir é enganar, é falsificar, faltar com a verdade, induzir a erro, iludir. A mentira geralmente nos remete a um significado que, principalmente hoje, está atado à política, sobretudo aos políticos, e, mais especificamente, aos políticos brasileiros. Em nossa sociedade, o discurso político transmite uma mentira muitas vezes camuflada pelo humor e pelo discurso poético.

O artigo da revista Estudos Semióticos discute os “discursos mentirosos”, traçando uma comparação com os discursos poéticos e humorísticos e “o papel deles no discurso político brasileiro”. Diana Barros relata suas pesquisas a respeito dos discursos preconceituosos e intolerantes, a verdade e a mentira dos discursos, “dando continuidade a trabalhos sobre a relação entre linguagem, discurso e sociedade”. A autora apresenta as estratégias discursivas mais utilizadas no momento em relação aos discursos políticos brasileiros que se valem da mentira mesclada com humor e uso de recursos poéticos em “charges, memes e outros”, que se espalham por todas as redes sociais.

A análise foca em três espécies de discursos mentirosos:  as fake news, “as falsas revisões História e da ciência” e performances de verdadeiros “atores” que representam padrões pré-estabelecidos, com a mentira e a falsidade ocultas por trás do personagem. Esses discursos demonstram claramente a manipulação dos valores e crenças dos destinatários para que se interprete mentiras como verdades, mas são desmascarados pelas contradições e incoerências que apresentam aos olhares críticos em relação a esses discursos recrutadores do poder.

É notório que a mentira ocorre nos discursos em que estão presentes a intolerância, o julgamento moral, a segregação social, os preconceitos de toda ordem, cujo tom predominante é o medo e o ódio e “aparecem na maior parte das fake news”. A pesquisa propõe analisar comparativamente os discursos mentirosos, poéticos e humorísticos quando se estuda os discursos políticos brasileiros, que se utilizam de duas estratégias discursivas mais atuais: as divulgadas pelas redes sociais, sempre falsas, e as estratégias de humor e cunho poético de charges e memes.

A posição política escolhe sua estratégia, segundo a autora: “a extrema direita no Brasil emprega nas redes sociais, com mais frequência, os discursos baseados na mentira, enquanto a esquerda brasileira tem preferido os recursos do humor”. As duas estratégias têm o intuito de “fisgar” o sujeito com apelos emocionais bastante piegas. É importante diferenciar os discursos mentirosos e os poéticos e humorísticos. Se o discurso mentiroso tenta se aproximar do leitor pela emoção e pelas impressões sensoriais, nos discursos humorísticos e poéticos, apesar de também contarem com esses recursos, estabelecem elos racionais, de reconhecimento do real e do pensamento crítico, pois além do prazer estético, o leitor é convidado à reflexão sobre sua realidade.

Se o discurso na política parece verdadeiro, mas é falso, nos discursos poéticos e de humor, há um segredo: uma piada, por exemplo, ou um poema, que podem parecer “coisa inventada” da qual se ri ou se toma como simples devaneio poético, é um discurso verdadeiro, pois se usa da estratégia da camuflagem aparentemente falsa, para se relatar ou se mostrarem fatos e situações reais. Cita-se a charge de Alexandra Moraes, em que o presidente brasileiro é representado por um pintinho, vestido de verde e amarelo. Claro, “o presidente não é, segundo os conhecimentos e crenças usados na interpretação, um pintinho ou uma galinha”, afirma a autora. Desse modo, há a clara mensagem da ficção que representa a realidade.

Charge de 17 de agosto de 2019. Fonte: Alexandra Moraes/Folhapress

Na charge de Benett, há o recurso da caricatura, com excessos que têm como objetivo fazer rir o leitor, mostrando “o texto do enquadramento, pelo STF”, da homofobia como crime de racismo e “com o pedido da bancada evangélica, em audiência com um ministro do Supremo, de que o tema fosse retirado da pauta”.

Charge de 14 de fevereiro de 2019. Fonte: Benett/Folhapress

Jean Galvão, em sua charge, explora, valendo-se do humor, a censura confirmada na atitude de Marcelo Crivella, quando prefeito do Rio de Janeiro, ordenando que fossem recolhidos gibis expostos na Bienal do Livro do Rio de Janeiro que continham, na capa, dois rapazes se beijando, para “proteger os menores”, justificou o prefeito por sua proibição.

Charge de 8 de setembro de 2019. Fonte: Jean Galvão/Folhapress

O texto “Os dias em que rimos de nervoso”, da escritora Claudia Tajes, é citado por Diana Barros como uma síntese do assunto do artigo, um desabafo final: “Foi um ano para rir de teimoso […] no apagar das luzes, ainda dá para rir de algumas cenas. Sempre com uma lágrima inconveniente querendo cair […] quando um presidente dizendo ‘I love you’ para o outro [..] a primeira reação é dar uma gargalhada”, compartilhar nas redes sociais, pois a piada parece boa, só que, quando percebemos que não é uma piada, mas sim a realidade, a verdade, a vontade é de chorar.

Artigo

BARROS, D. L. P. de. A mentira e o humor no discurso político brasileiro. Estudos Semióticos, São Paulo, v. 17, n. 1, p. 1-12, 2021. ISSN: 1980-4016. DOI:  https://doi.org/10.11606/issn.1980-4016.esse.2021.182077.Disponível em: https://www.revistas.usp.br/esse/article/view/182077. Acesso em: 20 abr. 2021.

Contato

Diana Luz Pessoa de Barros – Professora titular e emérita da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo e do Centro de Comunicação e Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie, e bolsista produtividade (Pesquisador 1A) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). e-mail: ianaluz@usp.br  e dianaluz@mackenzie.br

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